sexta-feira, fevereiro 02, 2007

A não-democracia dos números

Luis Nassif, Coluna Econômica, 02/02/2007

Com poucos dias de divulgação, quais os resultados concretos dos novos critérios de contabilização das despesas da Previdência Social?

1. Os analistas passam a trabalhar os dados da previdência pública separados do Regime Geral da Previdência.

2. O Ministro da Previdência Social Nelson Machado anuncia que a Previdência não mais aceitará conceder isenções a programas não previdenciários, se não houver a garantia de cobertura dos incentivos pelo Tesouro.

3. Quando se fala em ajuste da Previdência, é para resolver um déficit que no ano passado foi de R$ 3,8 bi, e não mais os R$ 40 bi que eram brandidos por economistas pouco comprometidos com dados reais.

Nos anos 80, havia uma barafunda nos números do setor público brasileiro. Existia apenas um orçamento que englobava o orçamento propriamente dito (aquele que passava pelo Congresso), mais as contas da Previdência, mais as contas das estatais. Era impossível avaliar corretamente o tamanho do déficit público. Houve uma longa disputa para separar os orçamentos.

Havia também a conta movimento do Banco do Brasil. O governo criava programas em cima de programas, subsídios em cima de subsídios, e jogava para o BB. Este, por sua vez, lançava tudo nessa conta-movimento, que era um buraco sem fundo. O Tesouro simplesmente cobria o que caía na conta. Foi uma longa luta para acabar com essa confusão e falta de transparência.

Não há diferença conceitual entre a conta movimento do BB e a conta movimento da Previdência. Do jeito como se contabilizam os gastos da Previdência, o governo pode criar a isenção que quiser, beneficiar o setor que quiser, e lançar à conta da Previdência. Essa promiscuidade acabou elevando o déficit da Previdência a números fantasiosos e incorretos.

Porque os bravos economistas que brandiam esses números como tacapes pré-históricos jamais cuidaram de apresentar as contas corretas? Porque muitos colunistas econômicos repetiam esses clichês sobre o buraco de R$ 40 bi, e cotinuam repetindo, sendo que quase todos louvaram o fim da conta movimento?

É porque a manipulação de números jogava toda a conta em cima dos contribuintes do INSS, não apenas dos trabalhadores como das empresas. Esse foi o grande engodo em que embarcaram muitas federações industriais, ao aceitar esse discurso falso.

A maneira como alguns colegas reagiram à nova contabilidade é inacreditável. Ainda ontem insistiam que se tratava de manipulação contábil para esconder o déficit público. Esconder como? O tamanho do déficit final não será alterado. O que mudará será esse procedimento falso de jogar todo esse déficit na conta da Previdência.

É uma clara manipulação de quem não sabe analisar política econômica em ambiente democrático. Abusam do engodo para passar a conta para frente, jogando nas costas da parcela mais fraca da população.

Durante trinta dias, o economista Fábio Giambiagi foi presença diária em todos os veículos do Sistema Globo, fazendo seu proselitismo em cima de dados manipulados.

Admitir o engano, seria uma maneira de engrandecer o jornalismo do sistema Globo. Vamos ver o que Ali Kamel diz sobre isso.

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