quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Midia silencia sobre inspeção de senadores às obras do metrô de SP

O jornalista Mino Carta registra e comenta em duas notas no seu blog, intituladas "A glória de Alferes" e "Da senatorial comitiva", a poderosa operação montada pelo governador José Serra e seu Secretário de Comunicação, Hubert Alqueres, para evitar que a mídia noticiasse a inspeção nas obras da Linha 4 do Metrô de São Paulo, realizada domingo por uma comissão de senadores.

Vejam o que diz Mino Carta: "Ontem veio a São Paulo a comissão do Senado que pretende investigar os contratos do metrô paulistano. O motivo é óbvio, a voragem da linha 4, estação Pinheiros. Nosso queixo não desabará se a operação senatorial der em nada, mas os parlamentares vieram e inspecionaram diligentemente as obras. Foram acompanhados por jornalistas e câmaras, além de curiosos. Estranhamente, rádios e televisões não transmitiram, ontem ainda, uma única, escassa informação a respeito, assim como, na manhã de hoje, O Estado de S.Paulo e a Folha silenciaram. Sabemos que as reportagens chegaram a ser editadas, mas não foram ao ar, ou ao prelo. A explicação está na aliança ítalo-espanhola. O governador preferia que a visita dos senadores ficasse em nuvem alvíssima, e o secretário Alqueres desencadeou uma blitz junto às redações, de sorte a ser cumprida a vontade do seu amo. Serra, isso não é de hoje, goza de imenso prestígio junto aos patrões da mídia nativa, com os quais mantém contatos periódicos, sobretudo quando algum profissional desabrido mostra-se inclinado a exercer o espírito crítico".

Realmente, nada justifica esse silêncio da mídia diante de uma notícia como essa. É lamentável.

Imaginem se fosse num governo do PT...

Do blog do José Dirceu

Grande mídia muda de argumento para requentar denúncias de ex-embaixador

A resistência da grande mídia em aceitar diferenças retorna aos jornais, mais uma vez com as declarações do ex-embaixador do Brasil nos EUA, Roberto Abdenur, que ontem compareceu no Senado, a convite do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) - aquele que introduziu Marcos Valério no financiamento de campanhas políticas - para explicar suas denúncias veiculadas na revista Veja. A Folha de S.Paulo confunde-se de Eduardo: disse que o ex-embaixador foi convidado por Eduardo Suplicy (PT-SP). Grave? Sim, mas acontece com freqüência quando a cobertura é feita de orelha.

Nos demais jornais - alguns poucos, outros mais - a ida de Abdenur ao Senado ressuscita a estratégia de supervalorizar as denúncias vazias do ex-embaixador. Na primeira onda denuncista, ganhou peso a entrevista à Veja. Nela, entre outras denúncias (vide posts anteriores, por favor), ele acusou a política externa brasileira de ser anti-americana.

A campanha noticiosa que a revista abriu foi prontamente abraçada pelos jornais nas “repercussões”, e com igual barulho. A aposta era firme para a criação de nova crise no governo, desta vez desqualificando a política externa dos últimos anos. Mas, para azar deles, o noticiário emulado foi surpreendido com o desembarque, em Brasília, da missão norte-americana de primeiro nível, portadora do convite dos EUA para o Brasil ser sócio no megaprojeto de expansão da produção de biocombustível.

Os jornais contorceram-se em editoriais e novas reportagens para manter a verdade noticiada, muito diferente da verdade dos fatos.

Sintomaticamente, no noticiário sobre a ida do ex-embaixador ao Senado, os jornais de hoje não martelam mais na denúncia de anti-americanismo do governo Lula. Convenientemente, deixaram de lado essa argumentação, que não se sustenta mais. Afinal, há quase duas semanas, quase que diariamente, o noticiário continua explorando detalhes do que pode sair da parceria oferecida pelos EUA - a “Opep do etanol”. Mais: como segurar a denúncia de anti-americanismo ao lado das notícias sobre os preparativos da visita de Bush ao Brasil, no final semana que vem?

Restou-lhes carregar as tintas nas denúncias de ideologização do Itamaraty.

A denúncia mais grave de Abdenur nesse quesito – de que as promoções no Itamaraty vêm sendo mais influenciadas pela preferência partidária do que pela competência – foi desmentida pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim. Em mais de uma entrevista, ele pediu a Abdenur para apontar um único caso onde a grande inversão de valores teria ocorrido. Abdenur calou.

Ontem, esperava-se que ele desse nomes aos bois no Senado, mas nada. Os senadores aventaram até mesmo a possibilidade de promover uma reunião secreta para que Abdenur pudesse listasse os diplomatas que foram beneficiados ou prejudicados por essa prática. Mas desistiram. Por que? Os jornais não informam o porquê. Preferem reafirmar que Abdenur “reforça” (Folha e Estado) ou que “ratifica” (Globo) as críticas contra “a cúpula do Itamaraty de contaminar a carreira diplomática com questões ideológicas”, como publica o mesmo Globo hoje.

A dificuldade da grande mídia em aceitar pensamentos diferentes dos seus foi, mais uma vez, exposta na entrevista com o economista Tom Trebat, publicada no Estado do último domingo. Apresentado pelo jornal como “brasilianista da Universidade de Columbia”, Trebat, na verdade, é diretor-executivo do Centro de Estudos Brasileiros da Universidade de Columbia, e ex-diretor da divisão de América Latina do Citigroup - em resumo, alguém que não pode ser taxado de esquerdista ou petista-lulista.

O jornalista Pedro Dória perguntou-lhe:

Apesar do bom relacionamento entre Bush e Lula, discute-se nas últimas semanas se a diplomacia brasileira tem hoje um certo acento anti-americano.

Trebat respondeu:

Ninguém aqui (nos EUA) teme que o Brasil seja anti-americano. O que há é que o Brasil está muito acostumado a ver o mundo pelo viés dos governos dos EUA. E agora isto está mudando. Cada vez mais, as relações entre os dois países se dará no setor privado, com pouca participação governamental.

Sublinho: O que há é que o Brasil está muito acostumado a ver o mundo pelo viés dos governos dos EUA.

A boa entrevista colhida por Pedro Dória insistiu em outra fixação da grande mídia: Hugo Chávez. De novo, o brasilianista confirmou que o presidente venezuelano incomoda muito mais as famílias que controlam a mídia na América Latina do que o governo de Bush:

Ele faz barulho, mas não é uma ameaça para os EUA. Só cria instabilidade política. Pode ser que eu esteja enganado, mas acho que o auge de Chávez já passou. Quando Felipe Calderón ganhou no México, em parte pelo medo de “chavização” do país, Rafael Corrêa teve de mudar de linha, no Equador. Eu não exageraria a importância prática de Chávez. Mas também não existem vozes para contradizê-lo na América Latina. Ele fala as coisas mais absurdas, numa base diária, e não há ninguém, não há uma voz erguida para dizer que os gastos fiscais de seu governo são um desastre, que suas políticas são paternalistas, que suas cooperativas não funcionam. Ninguém está a fim de seguir a linha de Chávez, sobretudo no Brasil.

Dória retrucou:

Mas o presidente argentino Néstor Kirchner sugeriu esta semana que Washington quer o Brasil assumindo uma liderança anti-chavista na América Latina.

Trebat respondeu:

Os EUA nunca pediriam ao presidente Lula que tomasse uma posição agressiva contra Chávez. Alguém tem que enfrentá-lo, mas não precisa ser Lula. O Brasil é percebido aqui como um aliado discreto. A visita de Bush não terá por objetivo dividir a América Latina em dois blocos. Para os EUA isso não é necessário e, para o Brasil, não é desejável. O que há é um interesse em construir melhores laços de comércio. Do ponto de vista americano, se você olhar a região, há um problemão na Venezuela, um problema menor na Bolívia, talvez um terceiro no Equador. .. Mas, no resto do continente, o que houve foi um tipo de contra-revolução a favor de líderes moderados, como Lula.

28 de Fevereiro de 2007 @ 06:21 por Alceu Nader - www.blog.contrapauta.com.br

Governo comemora resultado das negociações com Uruguai

Depois do entendimento com a Bolívia, o relançamento das relações com o Uruguai. O Itamaraty está comemorando discretamente os resultados das conversações entre os presidentes Lula e Tabaré Vasquez, ontem, em Colônia de Sacramento. Ao fim da reunião, o Uruguai desistiu da idéia de negociar um tratado de livre comércio com os Estados Unidos, o que na pratica acarretaria sua saída do Mercosul. Bush estará em Montevidéu no início de março, depois de uma visita a São Paulo.

No encontro, foram assinados vários acordos e impulsionadas algumas iniciativas que, de um modo geral, beneficiaram fortemente o Uruguai. Nosso vizinho ressente-se do fato de, nos últimos anos, estar perdendo espaço nas trocas comerciais com os demais países do Mercosul. Suas exportações para o Brasil, no ano passado, por exemplo, foram da ordem de US$ 600 milhões, contra importações no valor de US$ 1 bilhão.

Os uruguaios queixavam-se com razão de uma série de obstáculos burocráticos, fiscais e alfandegários que impediam o crescimento de suas vendas para nosso país. E pediam também um esforço do Brasil para gerar projetos comuns capazes de emprestar dinamismo à economia uruguaia.

De um modo geral, esses pleitos foram atendidos. A Petrobras deve partir para a instalação de uma fábrica de etanol no Uruguai e injetará também recursos na construção de uma linha de transmissão, de gasodutos e de uma planta de gaseificação, contribuindo para minorar o problema energético de nossos vizinhos. Além disso, o BNDES financiará a construção de uma grande fábrica de cimento, bem como as obras do anel rodoviário de Montevidéu e da segunda ponte sobre o rio Jaguarão, a serem tocadas por empreiteiras brasileiras.

Lula comprometeu-se ainda a trabalhar para que a indústria automotiva brasileira formate um programa especial voltado para a renovação de toda a frota de ônibus de Montevidéu e das principais cidades uruguaias, do qual participem empresas locais de autopeças. No médio prazo, há possibilidades de que estaleiros sediados na margem oriental do Rio da Prata participem de trabalhos de reforma de navios brasileiros.

No Itamaraty, a avaliação é de que o saldo da rodada de conversações de ontem foi extremamente positivo. Praticamente fechou a porta a saída do Uruguai do Mercosul, produziu um novo clima nas relações entre Brasília e Montevidéu e abriu uma nova etapa de cooperação entre os dois países. À primeira vista, o Brasil foi generoso, ao atender a pleitos que gerarão atividade econômica, emprego e renda no Uruguai. Mas, ao se olhar mais para frente, se verá que o Brasil também sairá ganhando com o estreitamento dos laços econômicos com nosso vizinho. Afinal, a tecnologia, as empresas e os capitais envolvidos nas várias frentes de cooperação serão, em quase todos os casos, brasileiras.

No próximo dia 8 de março, Bush chega ao Brasil para uma rápida visita; O Itamaraty quer uma agenda enxuta de discussões, centrada basicamente em três pontos: Organização Mundial do Comércio, etanol e Conselho de Segurança da ONU. O Departamento de Estado, provavelmente, tentará incluir nas discussões um quarto tema: a situação geral da América do Sul – leia-se Hugo Chavez. O Brasil não se furtará a conversar sobre o assunto, dentro da linha de sempre de respeito à autodeterminação dos povos e aos processos internos de cada país. Mas tudo indica que o grande tema do encontro será mesmo o etanol. No encontro, devem ser amarradas as linhas mestras para o lançamento, no final de março, durante a visita de Lula a Washington, de um mega-programa de produção de biocombustíveis, com capitais americanos e tecnologia brasileira, na América do Sul, na América Central e na África.

A expectativa no Palácio do Planalto é grande. As preocupações, também.

Por Franklin Martins

terça-feira, fevereiro 27, 2007

Caixa rebate denúncia de lavagem de dinheiro por loterias

Vai definitivamente por água abaixo o último restinho de credibilidade que pudesse ter o senador tucano Álvaro Dias, do Paraná. Sempre no afã de desmoralizar o governo, foi pego na mentira, de novo. É um histrião manjado.

O superintendente nacional de loterias da Caixa Econômica Federal, Paulo Campos, afirmou, nesta terça-feira, que a denúncia de uso das loterias federais para lavagem de dinheiro, feitas na segunda-feira pelo senador Álvaro Dias (PSDB/PR), “é requentada”, pois foi baseada em informações da própria Caixa de 2004. “Não sei se é para aparecer (que Dias teria feito a denúncia), mas que é requentada, é”, afirmou Campos.

O superintendente da Caixa enfatizou que não há qualquer denúncia ou indício de fraude nos sorteios das loterias federais e o que o senador oposicionista acusa é a possibilidade de operações, fora da Caixa, com o objetivo de “esquentar” dinheiro de origem ilícita.

Campos admitiu que jogos e loterias são usados em todo o mundo para lavagem de dinheiro, mas é o setor, hoje, em que há o maior índice de redução desse tipo de atividade. “Não é mais um bom negócio lavar dinheiro com as loterias” federais, desde a implantação do Conselho de Controle das Atividades Financeiras (Coaf) em 2002, pois, segundo Campos, todas as movimentações suspeitas são levadas à investigação pela Polícia Federal, Ministério Público e Receita Federal.

Os 29 casos suspeitos apontados pelo senador Álvaro Dias ocorreram no período de 1994 a 2002, disse Campos, explicando que a Caixa informa ao Coaf e este aciona as autoridades com poder de investigação, toda vez em que são creditados mais do que um prêmio, igual ou superior a R$ 10 mil, a um único CPF, no período de até doze meses. Mas todas as investigações posteriores correm no âmbito policial, da Receita e do Ministério Público, que não comunicam os resultados à Caixa. Esta, por sua vez, não tem autoridade para investigar fora de seus quadros.

“As loterias são o serviço público mais auditado que todos. O Tribunal de Contas da União (TCU) fiscaliza o dia a dia, de forma preventiva; tem acompanhamento da Controladoria Geral da União (CGU) e os sorteios são público”, argumenta Paulo Campos. "Qualquer tipo de rede para lavagem de dinheiro por esse meio só pode ser coisa do passado, pois hoje não há como escapar ao controle", afirmou.

Campos também não considera factível a montagem de uma rede para compra de bilhetes premiados, uma vez que a Caixa distribui mais de R$ 140 milhões de prêmios por ano, decorrentes de jogos em mais de nove mil lotericas em todo o país, sendo inviável a “premonição” sobre onde o ganhador vai descontar o seu bilhete, que é ao portador.

Campos comentou que todo e qualquer aperfeiçoamento nos mecanismos de controle na lavagem de dinheiro será bem vindo, a respeito do projeto de lei de Dias, que fixa o bloqueio no pagamento de prêmios, sempre que haja indícios de irregularidades.

27/02 - 17:17 - Murilo Murça - Último Segundo/Santafé Idéias

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Do Brasil que tem água para o Brasil que não tem água: pela transposição das águas do São Francisco - III

III – O desenvolvimento do semi-árido

1 - O que impediu, até agora, o desenvolvimento econômico do semi-árido?

Foi principalmente a escassez de água, seja das chuvas, dos rios ou de outras fontes. E sem abastecimento assegurado de água, nada vai mudar no semi-árido nordestino. O desenvolvimento de grande parte da região Nordeste está comprometido pela escassez de água nas bacias dos rios intermitentes, o que leva a uma condição crítica de vida humana. O Ceará, o Rio Grande do Norte e a Paraíba não dispõem de uma fonte permanente de água, isto é, eles não têm rios perenes, como é o São Francisco, que beneficia Minas Gerais, Bahia, Sergipe, Alagoas e Pernambuco, e como é o Parnaíba, que beneficia o Piauí. Assim, o sertanejo fica à espera de uma chuva que por vezes vem, permitindo-lhe garantir comida e renda precária em alguns anos, mas nunca em quantidade suficiente para garantir reservas para os anos secos. É um jogo de loteria com a natureza, que raramente permite capitalizar o pequeno produtor, melhorar sua tecnologia e viabilizar a saída da indigência. A pobreza rural perpetua-se, aumenta a dependência dos políticos e gera contínua migração. É, ainda, uma das chagas expostas do Brasil.

2 - Mas é legal tirar água de um rio para colocar em outro?

A Lei de Recursos Hídricos (9.433/97) determina que o Estado deve garantir a necessária disponibilidade de água para a população, onde ela reside. Além disso, a gestão dos recursos hídricos, embora realizada por bacias hidrográficas isoladas, não determina os direitos de quem pode ter acesso à água, especialmente nos rios federais, cuja água pertence à toda sociedade brasileira. O governo entende que a integração da bacia do São Francisco às do Nordeste Setentrional é essencial para promover a igualdade de oportunidades para todos os brasileiros, evitando que uns sejam prejudicados, sem necessariamente beneficiar os outros, pois existirá água para todos, ainda durante muitas décadas, sem a necessidade de trazer água de rios de outras regiões para o Nordeste.

3 - Como é a distribuição de água no Brasil?

A distribuição das fontes de água no país é desigual. Enquanto a Amazônia, com cerca de 10% da população brasileira, detém 70% da disponibilidade da água doce do País, o Nordeste, com 30% da população nacional, dispõe de apenas 3% de toda a água doce do Brasil. Essa desigualdade é também flagrante no próprio Nordeste. Repare: a bacia do São Francisco concentra 63% da disponibilidade de água da região nordestina, sendo que 95% de sua vazão vai para o mar; a bacia do rio Parnaíba (Piauí/Maranhão) detém 15% da água disponível no Nordeste. Portanto, essas duas bacias dispõem de 78% das disponibilidades de água da região. Por sua vez, as bacias dos rios intermitentes nordestinos detêm apenas 22% da água disponível, os quais se concentram em alguns açudes estratégicos de grande porte e em aqüíferos profundos próximos à Zona Costeira. Em compensação, 2/3 da população residente estimada para 2025 vivem justamente nessas bacias deficitárias.

4 - Qual é a gravidade desse problema?


Essa concentração de população em uma área com pouca água cria sérios problemas econômicos e sociais. A disponibilidade hídrica per capita é inferior ao índice crítico de 1.000 m³/hab/ano, indicado pelas Nações Unidas como o mínimo para garantir a vida humana e a preservação ambiental. Nas bacias do São Francisco e do Parnaíba, esse índice é da ordem de 2.000 m³/hab/ano para a população estimada para o ano 2025. Nas bacias dos rios intermitentes, o índice já é, hoje, inferior a 1.000 m³/hab/ano, e tende para 500 m³/hab/ano ou menos, no ano 2025. Para que haja desenvolvimento sustentável equilibrado e harmônico na Região do Polígono das Secas, será necessário distribuir melhor a água local entre a população, integrando as bacias superavitárias às bacias deficitárias, além de construir os projetos de distribuição interna da água em cada sub-região. A situação hídrica do Nordeste Setentrional é agravada, ainda, pela maior probabilidade de ocorrência de secas, levando a crises sociais e econômicas periódicas, que acarretam pobreza, migrações e falta de competitividade econômica.

5 - O que é o Nordeste Setentrional?


O Nordeste Setentrional, situado ao norte da bacia do São Francisco, engloba os Estados do Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte, parte de Pernambuco (Agreste e Sertão) e parte de Alagoas.

6 - Em média, quanta água uma pessoa consome por ano?


Para viver plenamente em todos os aspectos, as Nações Unidas recomendam um consumo de no mínimo 1.000 m³ por habitante/ano, aí considerando a água não só para beber, mas para todos os usos sociais e econômicos que podem proporcionar uma vida digna ao homem. Só para produzir uma tonelada de alimentos são necessários, em média, 1.000 m³ de água. Atualmente, milhões de pessoas no semi-árido Nordestino sobrevivem com quantidades bem menores de água, mas isso impede que as atividades econômicas se desenvolvam normalmente, perpetuando a pobreza. Por essa razão, o semi-árido nordestino é uma das regiões mais pobres do Brasil e do mundo. Estima-se que cerca de 17,5 milhões de nordestinos vão ter 500 metros cúbicos ao ano – ou menos – à sua disposição, nos próximos 20 anos. Isso é menos da metade do mínimo recomendado pela ONU.

7 - Mas uma pessoa bebe no máximo uns três litros de água por dia, não é?

É verdade, mas a água não é só para beber. Todo mundo precisa tomar banho, cozinhar, lavar pratos, lavar roupa, dar descarga no banheiro, e assim por diante. Quando se faz a conta, o número é bem maior do que o necessário para beber. Além disso, na conta feita pelas Nações Unidas está incluída a água para o cultivo dos alimentos que cada pessoa vai consumir e para a produção de todos os itens que consome (roupas, livros, artigos industriais etc) individualmente ou, indiretamente, de forma coletiva.

Política externa brasileira é "a favor do Brasil e não contra qualquer país"

A Folha nessa ficou falando sozinha, e a entrevistadora deu com os burros n'água, ao insistir na tese, evidentemente falsa, de anti-americanismo por parte da política externa brasileira. O embaixador Samuel Pinheiro Guimarães foi fino ao expor o preconceito da colunista da Folha. Vamos agora ver se esse papo furado cessa.


Entrevista com Samuel Pinheiro Guimarães

Secretário-geral do Itamaraty diz não haver ideologia no trabalho do ministério e nega antiamericanismo no governo Lula, mas manda recados sutis aos EUA

DEPOIS DE atravessar os quatro anos do primeiro governo Lula falando muito para dentro do Itamaraty e pouco para fora, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães deu uma rara entrevista em que nega antiamericanismo no governo e classifica a política externa de "pragmática e não ideológica". Não deixou, porém, de mandar recados sutis aos EUA. "Um mundo melhor", segundo ele, "será aquele em que as promessas de desarmamento se realizem, os preceitos do Direito Internacional sejam obedecidos pelas grandes potências, as diferenças econômicas entre os Estados se reduzam e o meio ambiente seja preservado". Por exigência dele, as perguntas foram feitas por escrito e respondidas por e-mail. Segue a íntegra da entrevista.

FOLHA - O ex-embaixador em Washington Roberto Abdenur declarou que há "um substrato ideológico vagamente anticapitalista, antiglobalização, antiamericano, totalmente superado" na política externa brasileira. O sr. concorda?
SAMUEL PINHEIRO GUIMARÃES - A política externa do presidente Lula, conduzida pelo ministro Celso Amorim, é pragmática e não ideológica; é a favor do trabalho sem ser contra o capital; compreende que a globalização apresenta oportunidades mas também riscos para os países subdesenvolvidos; é a favor do Brasil e não contra qualquer país. Como o próprio presidente e o ministro não se cansam de repetir, a política externa desperta o interesse e desfruta do respeito de todos os países, ricos e pobres; do Ocidente e do Oriente; da América do Sul e do Norte, o que se reflete no grande número de presidentes, primeiros-ministros, chanceleres, autoridades e empresários que vêm ao Brasil e desejam nossa cooperação política, econômica e social.

FOLHA - Os críticos da política externa afirmam que o Brasil tem uma participação há anos estacionada em 1,4% da economia norte-americana, perdendo milhões de dólares em negócios por conta de um suposto antiamericanismo. Como é possível menosprezar o principal mercado do mundo?
PINHEIRO GUIMARÃES - O aumento da presença da China no mercado americano fez com que, no período de 1999 a 2006, nas importações americanas, a participação do Canadá caísse de 19% para 16,9%; a do Japão, de 12,8% para 7,9%; a da Alemanha, de 5,3% para 4,9%; a da França, de 2,5% para 2,0%. Ao contrário, a participação do Brasil cresceu de 1,1% para 1,4%, refletindo o aumento de nossas exportações de US$ 10 bilhões para US$ 24 bilhões. São as empresas brasileiras que exportam: elas não menosprezaram o mercado americano, nosso principal comprador, e tiveram todo o apoio do governo brasileiro em seu esforço.

FOLHA - O sr. é uma espécie de símbolo do suposto antiamericanismo, inclusive por ser ferrenho adversário da Alca. Convém ao governo brasileiro mantê-lo no segundo cargo na hierarquia do Itamaraty? O objetivo é justamente marcar posição?
PINHEIRO GUIMARÃES - O cargo de secretário-geral das Relações Exteriores é de livre nomeação do presidente Lula, por indicação do ministro Celso Amorim. Cabe ao presidente e ao ministro, naturalmente, decidir sobre o que convém.

FOLHA - A Alca acabou, e o chanceler Amorim dizia que o importante era a OMC. Mas as negociações na OMC também empacaram. Onde o Brasil está errando?
PINHEIRO GUIMARÃES - As negociações na OMC estão em pleno andamento e há grandes expectativas. O Brasil tem tido papel central nessas negociações na liderança do G20 [grupo de 20 países em desenvolvimento liderado por Brasil e Índia] e em entendimentos com os interlocutores dos Estados Unidos e da União Européia. As perspectivas de uma conclusão positiva para o Brasil são maiores do que em qualquer outro momento.

FOLHA - A adesão da Venezuela ao Mercosul tem sido duramente criticada, pois seria uma forma de transformar o bloco em uma ponta-de-lança contra Washington, ou pelo menos num palanque para o presidente Hugo Chávez atacar Bush. O bônus da adesão compensa o ônus?
PINHEIRO GUIMARÃES - O comércio entre o Brasil e a Venezuela passou de US$ 880 milhões em 2003 para US$ 4,1 bilhões em 2006. Empresas brasileiras fazem grandes investimentos e constroem hidrelétricas, linhas de metrô, pontes, represas e sistemas de irrigação na Venezuela. Todos os membros do Mercosul estão de acordo quanto à adesão da Venezuela. O Mercosul é uma união aduaneira e não um bloco político de oposição a qualquer outro país e muito menos aos EUA, que, aliás, percebem isto perfeitamente.

FOLHA - Pelo menos na retórica, Chávez está ganhando aliados na região, como os presidentes Evo Morales, da Bolívia, e Rafael Corrêa, do Equador. É um novo pólo de poder?
PINHEIRO GUIMARÃES - Cada país da América do Sul tem o direito de cooperar com os demais países sem que isto signifique a formação de pólos de poder. Qualquer pretensão hegemônica de qualquer país encontra grande resistência dos demais, e a forma natural de influência é o exemplo, o que supõe relações de parceria, como as que o Brasil tem desenvolvido com cada país da América do Sul, com excelentes resultados.

FOLHA - De outro lado, o governo Bush praticamente escolheu o Irã como novo alvo, digamos, das preocupações norte-americanas. Esse será um tema do encontro Lula-Bush em 9 de março? O que o Brasil tem a ver com isso?
PINHEIRO GUIMARÃES - A agenda do encontro dos presidentes ainda não está definida. O Brasil, que tem a sexta maior reserva de urânio do mundo, domina a tecnologia de enriquecimento de urânio e tem uma demanda interna importante por energia, defende o direito de todos os países de desenvolver a tecnologia nuclear para fins pacíficos, desde que respeitados fielmente os compromissos internacionais. Nossa posição na AIEA se pauta por este princípio e pela preferência pelo diálogo como forma de solucionar impasses.

FOLHA - Há duas versões no governo e no Itamaraty: uma de que o sr. é decisivo para a formulação da política externa; outra de que, na verdade, é o grande executivo que está "botando a casa em ordem". Qual a verdadeira?
PINHEIRO GUIMARÃES - O presidente formula e dirige a política externa com o auxílio do ministro. Ao secretário-geral cabem as tarefas definidas pelo decreto 5979/2006, que são assessorar o ministro na execução da política e na orientação da secretaria de Estado e das missões no exterior.

FOLHA - Por que o sr. participou dos primeiros palanques do presidente Lula na campanha do segundo mandato, mas de repente sumiu?
PINHEIRO GUIMARÃES - Todo cidadão brasileiro tem o direito, e até o dever, de participar da vida política de seu país.

FOLHA - E por que o sr. decidiu impor livros de sua própria preferência para os diplomatas que estejam sendo promovidos ou assumindo missões no exterior? Qual o viés desses livros? E porque o ministro determinou o fim da prática?
PINHEIRO GUIMARÃES - Gilberto Freire disse: "O livro do sr. Álvaro Lins sobre o Barão do Rio Branco é um destes livros que desde as primeiras páginas nos dão o gosto raro de contato com uma obra monumental". Celso Furtado, sobre Bielschowsky, disse: "Considero "Pensamento Econômico Brasileiro" o mais importante trabalho já realizado para caracterizar e apreciar o considerável esforço produzido entre nós a fim de resgatar o Brasil das armadilhas do pensamento ortodoxo". Roberto Campos, ex-embaixador em Washington, sobre Bielschowsky, disse: "Erudito, objetivo e correto. "Pensamento Econômico Brasileiro" é referência indispensável, por sua análise balanceada e percuciente das controvérsias ideológicas da época". Rubens Ricupero, ex-embaixador em Washington, sobre o livro de Moniz Bandeira disse: "É uma obra original, uma autêntica história conjunta das relações diplomáticas do Brasil e da Argentina durante 133 anos. Tem razão, assim, o historiador americano Frank Mc Cann, ao apresentá-la como "leitura indispensável". Não conheço, nem creio que exista, outro trabalho desse fôlego, cerca de 680 páginas, que cubra de modo tão completo e analítico o período contemporâneo". Sobre "Chutando a Escada", de Ha-Joon Chang, professor de Cambridge, na Inglaterra, Charles Kindleberger, um dos maiores economistas americanos, disse: "uma crítica estimulante dos sermões dos economistas da corrente dominante dirigidos aos países em desenvolvimento." O aperfeiçoamento dos diplomatas é uma necessidade constante. A leitura de três ou quatro livros não poderia jamais modificar o modo de pensar de qualquer diplomata, mas pode trazer informações importantes. O ministro Celso Amorim considerou que a celeuma provocada não justificava a energia despendida.

FOLHA - O que se deve esperar de um bom diplomata? E de um diplomata brasileiro no mundo atual?
PINHEIRO GUIMARÃES - De um bom diplomata se espera que defenda e promova os interesses de seu país. De um diplomata brasileiro se espera que defenda e promova os interesses do Brasil, de acordo com os objetivos da política externa definidos no Art. 4º da Constituição Federal, em especial a independência nacional, a não-intervenção e a autodeterminação, e com a orientação do Presidente da República.

FOLHA - Como o Brasil pode interferir para que o mundo seja melhor? Aliás, o que seria, a seu ver, um "mundo melhor"?
PINHEIRO GUIMARÃES
- O Brasil pode contribuir para a preservação da paz, para o desenvolvimento econômico e social, para a construção da democracia na esfera internacional, de tal forma que cada sociedade, observados os preceitos fundamentais de autodeterminação e não-intervenção inscritos na Carta da ONU, possa prosseguir em sua evolução histórica.
Um mundo melhor será aquele em que as promessas de desarmamento se realizem; em que os preceitos do Direito Internacional sejam obedecidos pelas grandes potências; em que as diferenças econômicas entre os Estados se reduzam; em que o meio ambiente seja preservado; em que os direitos humanos, políticos, econômicos e sociais sejam respeitados; em que a pobreza e a miséria sejam abolidas; em que cada indivíduo possa desenvolver todo o seu potencial. Com esses objetivos, o presidente Lula e o ministro Celso Amorim têm defendido a democratização das instâncias internacionais de decisão, como o Conselho de Segurança da ONU e o G-8.

Por Eliane Catanhêde, Folha de S.Paulo, em 26/02/2007

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Dossiê: não há indícios contra Mercadante, conclui Procuradoria-Geral


Uma boa notícia para o PT, para o governo e para o senador Mercadante. A mídia conservadora elegeu o procurador geral da República como símbolo de probidade porque acatou a denúncia do mensalão. Agora, a legitimidade das suas canetadas se transfere automatica e positivamente para o senador Mercadante, que havia sido bombardeado por conta das ações dos aloprados. Menos mal.


O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) o fim das investigações contra o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) no caso da suposta tentativa de compra de um dossiê com informações que ligavam o ex-ministro José Serra (PSDB) à máfia das ambulâncias.

Souza pediu ao STF não abra inquérito contra o senador, após concluir que não há indícios de sua participação no caso. Nesta sexta-feira (23), ele enviou parecer ao ministro Sepúlveda Pertence.
Mercadante foi indiciado pela Polícia Federal (PF), mas cabia ao procurador-geral da República decidir se pederia ao Supremo a abertura de inquérito.

A partir do parecer da Procuradoria, o STF deve arquivar os documentos que citam o nome do senador e enviar o resto da investigação para primeira instância da Justiça. Isto porque não há nenhum outro indiciado com direito a foro privilegiado no Supremo.

Alívio
Mercadante comemorou a decisão da PGR. Em nota divulgada na tarde desta sexta-feira (23) por sua assessoria de imprensa, Mercadante disse estar "feliz porque está se fazendo justiça".

O senador reiterou, ainda, que "não há nem nunca houve qualquer envolvimento, qualquer participação" dele na "condenável tentativa de compra de dossiê".

Leia a íntegra da nota:

"Estou feliz porque está se fazendo justiça. Fui informado que o Procurador Geral da República, Antônio Fernando de Souza, que tem sido extremamente rigoroso em seus atos, realizou uma análise profunda e minuciosa sobre o inquérito, e, finalmente, concluiu pela improcedência do pedido de indiciamento e pelo arquivamento do processo. O que comprova que, como tenho dito e repetido desde o início deste lamentável episódio, que tanto me prejudicou, não há nem nunca houve qualquer envolvimento, qualquer participação minha nessa condenável tentativa de compra de dossiê. Aguardo agora, serenamente, o pronunciamento definitivo do Supremo Tribunal Federal (STF).

Senador Aloizio Mercadante (PT-SP)"

Brasil indica Paulo Nogueira Batista Jr, um crítico do BC, para o FMI

O governo vai substituir um economista da linhagem ortodoxa – identificada com as teses do “mercado” – por uma das principais vozes da corrente oposta (heterodoxa) como representante do Brasil e mais oito nações latino-americanas no Fundo Monetário Internacional (FMI). O novo indicado é Paulo Nogueira Batista Júnior, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo. Ele entrará no lugar de Eduardo Loyo, que fez carreira na Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro e foi diretor do Banco Central (BC) no início do primeiro governo Lula.

A troca foi comunicada nesta sexta-feira (23) pelo Ministério da Fazenda, a quem cabe fazer a indicação em nome do Brasil e seus oito parceiros (Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname, Trinidad e Tobago). Os nove países formam uma espécie de bloco de atuação conjunta no FMI. Os interesses do grupo são representados junto ao Fundo, em Washington (EUA), por um diretor-executivo.

Em nota distribuída à imprensa, a Fazenda informou que Loyo pediu para sair por motivos pessoais – voltará a trabalhar no Brasil. Ele foi diretor por dois anos, até setembro de 2006, quando o ministro Guido Mantega o reconduziu para outro mandato. Como diretor do BC, Loyo integrava a tropa conservadora, junto com o diretor de Política Econômica, Afonso Beviláqua, que em breve deve deixar o cargo. Os dois foram colegas na PUC-Rio, tida como maior referência da ortodoxia no meio acadêmico.

Paulo Nogueira, que deve assumir em abril, cumprirá o resto do mandato iniciado por Loyo. A Fazenda não informou por que o escolheu para a função. O professor da FGV é conhecido por sua visão crítica da política econômica produzida no governo Fernando Henrique e preservada na gestão Lula, de juros altos, liberdade de fluxo de dólares pelo país e pagamento de quantias elevadas de juros com dinheiro de impostos (superávit primário). Também critica a globalização e é contra à criação da Área e Livre Comércio das Américas (Alça), tema sobre o qual já escreveu um livro (A Alca e o Brasil).

Paulo Nogueira acredita, no entanto, que a chegada de Mantega ao comando da equipe econômica serviu para arejar um pouco a ortodoxia dos tempos de Pedro Malan e Antonio Palocci, ao menos no que diz respeito à política fiscal baseada em superávit primário. Ele foi uma das vozes ouvidas pelo ministro durante a elaboração do Programa de Aceleração do Crescimento – os dois conversaram no ministério antes do anúncio do PAC.

O economista foi negociador da dívida externa brasileira no governo de José Sarney (1985-1990), ocasião em que o país declarou moratória. Entre as nove nações que representará no FMI, duas ainda têm acordo com o Fundo (ou seja, ainda submetem suas decisões de política econômica à instituição): Haiti e República Dominicana.


André Barrocal – Carta Maior

Do Brasil que tem água para o Brasil que não tem água. Pela transposição das águas do São Francisco (II)

Segue a publicação, por temas, das consistentes razões pelas quais o governo Lula optou pela transposição das águas do Rio São Francisco como solução para as mazelas do semi-árido nordestino.

II – A Migração


1 - A transposição das águas do Velho Chico é uma questão de solidariedade humana?

É, sim. A pequena quantidade de água que será captada do Rio São Francisco não causará qualquer prejuízo aos seus usuários, mas terá importância vital para milhões de nordestinos que, com suas famílias, vivem na parte mais seca do Nordeste. A vida dessas pessoas, certamente, melhorará. Vale lembrar que a seca não só maltrata as pessoas e os animais, como também dilacera as famílias, por causa da migração forçada. Os mais jovens e mais fortes vão para outras regiões, procurar emprego para garantir a sua sobrevivência e dos seus parentes. Ficam no sertão as mulheres, as crianças e os velhos, muitos deles tão doentes e fracos que não têm como garantir comida e água até que chegue a ajuda dos que foram embora, empurrados pela seca. Alguns dos que migram não voltam mais, nem mandam notícias e suas famílias ficam destroçadas para sempre. Outros mandam buscar os parentes e vão morar em favelas na periferia das grandes cidades, com problemas diferentes (violência, desemprego, más condições de moradia, fome etc.), porém até mais graves do que os que enfrentavam no sertão nordestino.

2 - A migração por causa da seca é tão dramática assim?

É um drama pessoal e familiar que atinge centenas de milhares de nordestinos, principalmente. A migração forçada também causa sérios problemas para o governo federal, os governos estaduais e as prefeituras das grandes cidades, como o inchaço das regiões metropolitanas, a proliferação de favelas, o déficit de moradias, a insuficiência da infra-estrutura básica (transporte coletivo, saneamento, abastecimento de água, rede elétrica, escolas e hospitais), o desemprego e o aumento da criminalidade. Ou seja, a falta de água no semi-árido afeta não só quem está lá: acaba prejudicando até quem nunca passou pelo sertão nordestino.

3 - Há quanto tempo ocorre a migração por causa da seca?


Há pelo menos 150 anos. A migração do Nordeste em direção a outras regiões do país é um movimento populacional constante e antigo, dos mais importantes no mundo moderno. Também é volumoso, atingindo o auge nas secas prolongadas. Dezenas de milhões de nordestinos fugiram da seca em direção ao Norte, ao litoral, ao Centro Oeste e ao Sudeste. Pelo menos um terço dos habitantes da Grande São Paulo é composto por nordestinos ou descendentes de retirantes da região. Até o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, foi obrigado a sair de sua terra natal com parte da família, migrando para São Paulo. Em resumo, a falta de água no semi-árido dificulta a criação de empregos e a sustentação de suas populações.

4 - É possível impedir a migração para as grandes cidades?

Num país democrático, as pessoas têm o direito de ir e vir para onde e quando quiserem. O que tem que ser combatida é a causa da migração forçada, que é a falta de condições de vida digna no semi-árido por escassez de água. Havendo água, as famílias vão continuar unidas na sua terra natal, porque estará garantido o que beber e o que comer e haverá atividade econômica, com renda e empregos. Esse é o objetivo do projeto de integração da bacia do Rio São Francisco com as bacias dos rios intermitentes do chamado Nordeste Setentrional, que envolve o agreste e os sertões de Pernambuco, da Paraíba, do Rio Grande do Norte e do Ceará. A água vai permitir o desenvolvimento sustentável naquela região e só quem quiser vai precisar ganhar a vida em outros lugares.

Continua...
Na próxima postagem, a questão do desenvolvimento do semi-árido

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Do Brasil que tem água para o Brasil que não tem água: pela transposição das águas do São Francisco

Com a volta do tema à mídia, e o destaque dado à carta do padre que fez greve de fome, estamos aqui para retomar o debate e esclarecer as (boas) razões para que o Brasil que tem água permita ao Brasil que não tem água desfrutar de uma ínfima parte da vazão do São Francisco. Pra começo de discussão vamos publicando aos poucos os bons argumentos que embasam a vontade do presidente Lula, do governo - mas também a de vastas parcelas da opinião pública e principalmente, dos esquecidos do semi-árido nordestino.

I – O Rio

1 - É verdade que o Rio São Francisco está morrendo?


Não. O Rio São Francisco ainda é um rio muito saudável e pujante. Ele tem sido muito ameaçado pelos impactos da ação do homem, de que são exemplos a poluição por esgotos, as barragens construídas ao longo do seu leito para a geração de energia elétrica, o assoreamento causado pelo desmatamento crescente dos cerrados em benefício da agropecuária, e a agressão às suas matas ciliares. Apesar disto, o rio segue resistindo bravamente. Ele é e será uma fonte de sustentação econômica para os habitantes de sua bacia hidrográfica, porque continua a receber, na média, a mesma quantidade de chuva de antes, mantendo, sem alteração, há mais de duas décadas, o suprimento de energia elétrica ao Nordeste, beneficiando por igual todos os Estados da região. A quantidade de suas águas não está comprometida e o São Francisco está em melhor situação qualitativa do que muitos rios do Sudeste. Portanto, o rio não está morrendo.

2 - Mas o Velho Chico tem problemas?

Sim, o Velho Chico precisa ser mais bem cuidado, principalmente nos afluentes mais degradados pela ação humana, como tantos outros rios do país. Em alguns trechos, a derrubada das matas, que cobriam suas margens e encostas, provocou o assoreamento do leito do rio, que é a formação anormal de bancos de areia, o que prejudica a navegação e o habitat dos peixes. Em outros lugares, a falta de tratamento de esgoto das cidades ribeirinhas provocou a poluição das águas. De fato, é preciso cuidar melhor do Rio São Francisco.

3 - O rio precisa ser revitalizado?

Sim, e isso já está acontecendo. A revitalização hidroambiental da bacia do São Francisco é um programa coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, com a participação do Ministério da Integração Nacional e da sociedade sanfranciscana. O programa de revitalização do São Francisco contempla ações voltadas para o reflorestamento de áreas críticas, a construção de barragens em rios afluentes, a melhoria da calha navegável do seu curso médio, o tratamento de esgotos das cidades e vilas localizadas nas suas margens, o controle da irrigação e a educação ambiental. Há também ações para a melhoria das condições de vida das comunidades ribeirinhas. O Governo Federal investiu, em 2004, R$ 26 milhões nessas ações de revitalização do rio. Em 2005, os investimentos para a revitalização do rio chegaram a R$ 100 milhões, só na área dos Ministérios da Integração Nacional e do Meio Ambiente. Há outros recursos: desde 1988, a Chesf repassa, diretamente para os Estados e os municípios da Bacia do São Francisco, 6% do seu faturamento bruto, o equivalente a R$ 90 milhões por ano. É um dinheiro que, segundo a Lei, deve ser obrigatoriamente aplicado em ações de revitalização do rio. De 1988 até agora, a Chesf já repassou R$ 1,350 bilhão para os municípios sanfranciscanos. O Ministério das Cidades, por sua vez, está aplicando R$ 620 milhões em projetos de saneamento básico e/ou de abastecimento d’água em 86 municípios da Bacia. A degradação do rio, que já dura mais de 100 anos, não é uma ação de curto prazo e nem é responsabilidade somente do Governo Federal, mas também dos governos estaduais e municipais, que devem trabalhar juntos para o enfrentamento do problema.

4 - É verdade que o Rio São Francisco vai ser desviado?

Absolutamente não. Não é nada disso. O Velho Chico vai continuar no mesmo curso que sempre teve. Só uma pequena parte do seu volume – ou seja, apenas 1% da água que ele joga no mar – vai ser captada para garantir o consumo humano e animal na região do semi-árido nordestino, onde vivem 12 milhões de pessoas. Não haverá nenhum problema ambiental para o São Francisco ou para qualquer atividade econômica que hoje se desenvolve ao longo de seus 2.700 km de extensão. A quantidade de água a ser retirada é, realmente, muito pequena.

5 - Ainda assim, a retirada de água para perenizar outros rios não é prejudicial ao Rio São Francisco?


Não, por várias razões. Em primeiro lugar, há disponibilidade de água no Rio São Francisco para utilização no desenvolvimento do Polígono das Secas, assim como se tem feito com a sua energia hidrelétrica. Em segundo lugar, e é importante que se repita isto, a quantidade de água a ser retirada é muito pequena. A terceira razão é que essa captação vai ocorrer apenas em dois pontos e em locais onde a vazão do rio já está regularizada pelas barragens, não afetando as atividades econômicas nem a navegação. A quarta razão, é que a água a ser retirada vai ser usada principalmente para o consumo humano, para matar a sede de milhões de nordestinos que habitam o Polígono das Secas. Tudo isso será feito sem prejudicar o Rio São Francisco e em clima de concórdia, pois cabe ao Governo Federal zelar pela distribuição das oportunidades de desenvolvimento entre os irmãos brasileiros.

6 - Os usuários do São Francisco terão prejuízos?


Não, porque o curso do rio não será alterado e muito menos serão afetadas as condições hídricas e ambientais. Com esse projeto, vai acontecer o mesmo que já acontece em centenas de outros pontos do rio: haverá captação de água para abastecimento humano. O que muda é a quantidade de água, um pouco maior do que é captado em cidades de médio porte. Mas, ainda assim, a quantidade de água a ser retirada equivale a somente um por cento do que o rio joga no mar. Além disso, há milhões de pessoas vivendo no semi-árido com muito pouca água. Quando chega a seca, muitos não têm água nem para beber. Seria desumano ignorar essa situação dramática que aflige o Nordeste há séculos.


Continua...
Se quiser palpitar, fique à vontade. Amanhã falaremos sobre a geografia humana da questão.

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

Bolsa Família: um passo rumo à cidadania

“O programa não é assistencialista. Ele é um exercício de direito e provoca ações integradas”. É desta forma que Lúcia Modesto, diretora do Cadastro Único do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) defende o Bolsa Família. O programa, que já ultrapassou a marca de 11 milhões de famílias atendidas, destinou 7,5 bilhões de reais no ano passado para as camadas mais pobres da população. Embora não haja uma pesquisa do ministério que meça o impacto do programa – a primeira deverá ser realizada ainda neste ano – , é possível dizer que houve avanços desde outubro de 2003, quando foi implantado.

O Bolsa Família está dividido em três eixos fundamentais: o alívio imediato à pobreza, o investimento nas gerações futuras por meio do acompanhamento das condicionalidades e o desenvolvimento das famílias com a inclusão produtiva. A diretora do Cadastro Único lembra que na prática a universalização de serviços básicos – como saúde, educação e saneamento básico, por exemplo – não é real. “As famílias mais pobres são mais vulneráveis e acabam tendo maior dificuldade de acesso a tudo isso. E o programa tem conseguido aproximar as pessoas desses serviços”. Ela destacou ainda que “houve melhora no padrão alimentar das famílias. E em geral, as crianças atendidas pelo Bolsa Família estão melhor no que diz respeito à nutrição, o que muitas vezes é uma questão crítica na primeira infância”, disse Lúcia.

A posição de Lúcia tem respaldo em pesquisa feita pelo próprio MDS na “Chamada Nutricional”, em 2005. Na pesquisa, 17 mil crianças de até cinco anos, da região do semi-árido nordestino, foram pesadas e medidas. Dentre as famílias pesquisadas, 35,3% declararam ser beneficiadas pelo Bolsa Família. O levantamento mostrou que 92% das crianças avaliadas faziam ao menos três refeições diárias e apenas 6,6% apresentaram quadro de desnutrição crônica.

Outro dado apontado pela pesquisa mostra que entre as crianças atendidas pelo Bolsa Família o déficit altura/idade é de 4,8%, índice que aumenta para 6,8% entre os que ainda não são beneficiadas pelo programa. No mesmo levantamento, concluiu-se que crianças de seis a 11 meses de idade, caso não fossem atendidas pelo programa, teriam mais de 60% de risco de apresentar desnutrição crônica. “Isso é importante pois a faixa etária até um ano de idade é uma etapa bastante delicada que, se tiver déficit nutricional, poderá comprometer as outras fases da criança”, afirmou Rômulo Paes, secretário de Avaliação e Gestão da Informação do MDS quando da divulgação da pesquisa.

Segue a mesma linha avaliação feita pela Universidade Federal Fluminense em março do ano passado. Segundo as informações colhidas pelo DataUFF, por meio de entrevistas com 4 mil beneficiados, 66,9% do total declararam que a alimentação melhorou depois que passaram a receber o benefício; 18,7% disseram ter melhorado muito; 14,2%, responderam que continua igual e apenas 0,2% disseram ter piorado.
Mudança real

Mais do que estatísticas, levantamentos como esses revelam a realidade de pessoas com nome e endereço. Uma delas, que não participou destas pesquisas, mas que exemplifica bem os resultados obtidos pelo Bolsa Família é Maria Cristina Goes Santos. Aos 37 anos, com três filhos, é moradora de uma favela situada na avenida Ulisses Guimarães, em Diadema, na Grande São Paulo. Cristina vive num pequeno barraco de madeira. Quando chove, pinga água e por vezes ela teme que possa haver deslizamentos, já que sua casa fica na parte superior de um barranco. Além dela e das crianças, moram na casa seu marido, a irmã dela e seus dois meninos. Ela tinha direito a 95 reais, o máximo que o programa oferece por pessoa. Mas, abriu mão de parte dele depois que o marido arrumou emprego como ajudante-geral. Hoje, Cristina recebe 45 reais.

“Fiz isso porque acho que as coisas não devem ser feitas na base da mentira”, diz, explicando que com o salário do marido, a família passou a receber acima do máximo exigido pelo programa. Cristina também foi uma das participantes dos cursos de capacitação do programa e aprendeu a fazer bijuterias e sabonetes, que a ajudam a sustentar a família. Enquanto termina um colar e cuida da filha menor, Jennifer, de dois anos, Cristina conta que fez o curso de sabonetes no final de 2005. “Foi o que me salvou no final do ano. Ganhei um dinheiro e graças a deus pudemos ter um Natal melhor”.

O caso de Cristina se encaixa no que Lúcia Modesto chama de “inclusão produtiva”. Conforme explicou a diretora do Cadastro Único do MDS, a pobreza tem características muito distintas e para cada região é pensada uma alternativa diferente. “A renda de uma família deriva de vários fatores. Não é só questão de ter ou não ter trabalho porque muitas vezes as famílias não têm perfil de empregabilidade. Há famílias que não têm escolaridade nenhuma, então, terão dificuldades de criar mecanismos de autodesenvolvimento”. Para ela, está aí um dos pontos cruciais do programa. “A pobreza tem diversas dimensões e acho que essa forma mais integrada de enxergar o problema – tanto do ponto de vista da forma como se vê a realidade das famílias, quanto do ponto de vista da união de diversos atores públicos – é o maior mérito e o maior desafio do Bolsa Família”.

Embora o programa não tenha ainda conseguido mudar estruturalmente o problema da desigualdade social no Brasil, há pontos bastante positivos que devem ser lembrados ao se abordar o benefício. No livro “Bolsa Família – avanços, limites e possibilidades do programa que está transformando a vida de milhões de famílias no Brasil” (Perseu Abramo, 2006) o autor Marco Aurélio Weissheimer salienta que “no período entre 2001 e 2004, a renda dos 10% mais pobres subiu 23,3%, puxada pelos benefícios previdenciários vinculados ao salário mínimo e por programas sociais como o Bolsa Família”. Ele se refere à pesquisa feita pelo economista Marcelo Néri, da Fundação Getúlio Vargas.

Já o economista da Unicamp, Márcio Pochmann, em entrevista concedida à revista Terceiro Setor em 2006 afirmou que “há 25 anos temos tido baixo crescimento econômico, em torno de apenas 2% ao ano. Este governo é mais sensível à questão da pobreza, promovendo programas que amenizam, mas não superam a miséria no país. Deve haver uma política estratégica para fazer com que a população mais pobre deixe de depender dos programas de transferência de renda”.

Visão elitista

Lúcia Modesto refuta as teses de assistencialismo em torno do programa afirmando que “as elites no Brasil manifestam seu preconceito de várias maneiras. Argumentam que se deve investir apenas em educação, que é transformadora. Há uma série de suposições que a elite usa e que acabam definindo a linha de argumentação de cada um deles. O que temos dito é que não somos dogmáticos. Nossa única religião aqui é a do combate à pobreza nas suas mais variadas dimensões”. No mesmo sentido, Cristina, beneficiária do programa, diz que “existe muito preconceito dos ricos. Eles acham que a pessoa que ganha o Bolsa Família usa o dinheiro para beber, para fazer o que não deve, para não trabalhar. Eu, e outros que conheço e que recebem o dinheiro, gastamos com comida e material escolar”, relata Cristina.

Os números levantados pela UFF vão ao encontro do que a beneficiária diz com relação ao uso dos recursos. Entre os pesquisados atendidos, 76,4% disseram gastar o benefício com alimentação. Em segundo lugar, vêm os gastos com material escolar, que fica em 11%. Roupas/calçados e remédios vêm em seguida, com 5,4% e 1,5%, respectivamente.

Também contrariando a visão de que o programa poderia não atingir o público ao qual se destinaria, a medição feita pela UFF mostra que dentre os beneficiários entrevistados, 65% são negros e pardos. Segundo avaliação dos pesquisadores, publicada por Weissheimer, “estes resultados apontam já de início para o fato de que o Bolsa Família vem elegendo de forma acertada os seus beneficiários, na medida em que, como vários estudos têm apontado, a proporção de pobres no Brasil é muito mais elevada entre os pardos e pretos do que entre os brancos”.

Ainda merece destaque a questão da melhoria da auto-estima dos beneficiados, algo subjetivo mas que tem gerado alguns incômodos. No ano passado, o então candidato a senador por Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, chegou a declarar que o Bolsa Família estava retirando mão-de-obra dos canaviais, o que estaria prejudicando os usineiros. Mais recentemente, fazendeiros do interior de Minas Gerais se queixaram de que estariam tendo dificuldades em arrumar trabalhadores rurais. “Ninguém quer ficar mendigando a vida inteira um benefício e falar que prefere a bolsa a uma carteira assinada é fazer pouco caso do trabalhador”, disse o presidente da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg), Vilson Luiz da Silva, em contraposição à afirmação dos ruralistas.

Para Lúcia Modesto, o questionamento à exploração é um dos pontos nodais do Bolsa Família. “O programa tem suscitado, entre seus beneficiários, maior clareza quantos a seus direitos e sua cidadania”. Ela explica que o fato de o trabalhador receber o benefício dá a ele maior segurança para questionar as condições de trabalho e renda a que são submetidos. “O Bolsa Família dá às famílias um contra-ponto para reivindicar salários mais justos e dignos”.

Por possibilitar mudanças importantes nas vidas daqueles que recebem mensalmente o dinheiro é que o programa é bem avaliado por seus favorecidos. Segundo os 4 mil entrevistados pelo DataUFF, 38,8% avaliaram o Bolsa Família como ótimo e 49,9% como bom, ou seja, aprovação de mais de 88% do total, sem contar os que julgaram regular (9,8%). Apenas 1,6% julgaram o programa como ruim e péssimo. “Para mim, a vida melhorou muito depois que pude receber essa ajuda”, relata Cristina. Ela conta que está aguardando a demarcação dos lotes da favela, que está sendo urbanizada, para abrir um pequeno comércio dentro de casa. “Meu desejo é que as coisas continuem melhorando porque assim eu posso devolver o meu cartão para ajudar outras famílias”, finalizou Cristina.

Por Priscila Lobregatte, do www.vermelho.org.br

terça-feira, fevereiro 20, 2007

Para nos informarmos melhor

A mídia latino-americana é cada vez mais igual, de um país a outro: age como um bloco político e ideológico de direita, cada vez mais homogêneo. Faz oposição cerrada, em bloco, em países como o Brasil, a Argentina, a Bolivia, a Venezuela, o Equador. Isto é, se opõe frontalmente ao processo de transformações em curso no continente.

No segundo turno das eleições presidenciais brasileiras, Marco Aurélio Garcia pegou no nervo, quando disse duas coisas aos funcionários dessa mídia em uma entrevista coletiva, ao dizer-lhes duas coisas, absolutamente verídicas e inquestionáveis: que em um país como a Espanha, que quiser ler um jornal de esquerda, compra o El País, quem quiser ler um jornal de direita, compra o ABC. Enquanto que, no Brasil, todos os jornais são da mesma filiação ideológica, de direita. A outra, foi dizer a esses empregados dos órgãos da imprensa oligárquica, que o PT se ocupa da sua democracia interna, que eles se ocupassem da democracia – absolutamente inexistente – nas redações onde trabalham.

Mas cada vez mais podemos contornar essses órgãos –que cada vez mais parecem ser redigidos por uma única pessoa, assemelhando-se todos entre si – e buscar fontes alternativas de informação e discussão. A necessidade de informação local pode nos levar a assinar um jornal – ou mesmo lê-lo pela internet, contribuindo assim para a irresistível decadência de tiragem dos jornais, que este ano descerão da casa dos 200 exemplares diários, também para não contribuir a financiar suas campanhas direitistas -, mas podemos informar-nos pela internet.

Claro que temos os órgãos impressos alternativos, como Carta Capital, Brasil de Fato, Caros Amigos, Forum, entre outros. Mas é bastante útil acessar e ler diariamente ao melhor jornal do continente – o La Jornada, do México (www.jornada.unam.mx), de acesso gratuito, especialmente na sua cobertura internacional e da América Latina em particular, assim como os artigos de debate e a cobertura da situação mexicana.

Da mesma forma é bastante útil a leitura do Página 12, da Argentina (www.pagina12.com.ar), também de acesso gratuito. Esses jornais são a melhor fonte para seguir cotidianamente a situação na Bolívia, no Equador, na Venezuela, em Cuba – em suma, nos países que perturbam a hegemonia da direita no continente, tanto do império, quanto do oligopólio midiático de cada país e que, por isso, são vítimas especiais das deformações e das campanhas desqualificadoras.

O espanhol El Pais – este de acesso restrito (www.elpais.com.es) - também é fonte que pode resultar útil, embora sobre a Venezuela e Cuba seja particularmente hostil.

Na internet se pode encontrar muitas páginas alternativas, além de Carta Maior (www.agenciacartamaior.com.br) , inclusive as de jornalistas que trabalham na mídia tradicional – como Paulo Henrique Amorim (www.ig.com.br) , Luis Nassif , além do blog do próprio Mino Carta, na página da Carta Capital (www.cartacapital.com.br) entre outros -, que ajudam a diversificar a informação.

Entre as plublicações internacionais, é indispensável a leitura do Le Monde Diplomatique, que pode ser encontrado na página do UOL. Da mesma forma, a revista estadunidense The Nation (www.thenation.com) tem textos muito bons. Como revistas teóricas, há várias boas no Brasil, dentre elas Margem Esquerda (www.boitempoeditorial.com.br), Crítica Marxista (www.revan.com.br). Dentre as revistas teóricas internacionais, considero a melhor a New Left Review, que tem edição em inglês e em castelhano, accessíveis na página www.newleftreview.org).

Aqueles que tenham outras sugestões de fontes alternativas, de qualquer tipo, que favoreçam uma informação crítica e plural, além de promover debates frutíferos com visões progressistas, podem escrever, para que enriqueçamos a informação coletiva nesta luta contra o monopólio da palavra e pela criação de consensos democráticos no Brasil.

[Nós do Votolula recomendamos o Votolula e os sites amigos linkados ao lado]


Por Emir Sader, da Agência Carta Maior http://agenciacartamaior.uol.com.br/

O silêncio sobre as Comissões de Comunicação

O Correio Braziliense de quinta-feira (15/2) deu manchete de capa de quase meia página para a nova composição das Comissões Temáticas Permanentes da Câmara dos Deputados. O título era "Doadores emplacam seus deputados nas comissões da Câmara" e o subtítulo anunciava que "Políticos que tiveram campanha financiada por empreiteiras, mineradoras e outras empresas garantiram vaga nas seções que definirão projetos de lei a serem votados. Nomeações atendem aos interesses de grupos econômicos".

As matérias internas nas páginas 2 e 3 detalhavam a relação dos nomes de alguns integrantes de comissões, o valor das contribuições de campanha e os respectivos doadores cujos interesses privados estão vinculados aos temas nelas tratados. São relacionados nominalmente deputados de seis comissões: Agricultura, Seguridade Social e Família, Finanças e Tributação, Minas e Energia, Viação e Transportes e Desenvolvimento Urbano.

Figurinhas carimbadas

As graves acusações do Correio Braziliense provocaram protestos veementes de alguns deputados e o novo presidente da Câmara declarou que a Procuradoria Parlamentar iria verificar se cabe alguma medida judicial contra os jornalistas que assinam a matéria. "Um jornalista não tem autoridade para fazer insinuações sem prova", disse ele.

Ao ter entre seus financiadores legais um determinado grupo empresarial, o deputado estaria necessariamente submetendo sua ação parlamentar aos interesses desse grupo? A questão do financiamento das campanhas eleitorais é um dos objetos de discussão da inadiável reforma política que certamente o Congresso Nacional retomará na atual legislatura.

Vale registrar, no entanto, que estranhamente não constou da reportagem do Correio Braziliense a relação dos deputados e seus respectivos doadores da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI). No caso dessa Comissão podem, de fato, existir situações de conflito de interesse. Tem sido assim ao longo dos anos. E não só em relação aos doadores de campanha, mas sobretudo em relação aos membros titulares e suplentes da CCTCI que são, eles próprios, concessionários dos serviços públicos de radiodifusão.

Essa condição, inclusive, diferencia os membros concessionários da CCTCI de outros parlamentares que eventualmente tenham recebido doações de campanha de grupos empresariais com interesse direto em sua atuação parlamentar. Na CCTCI, o interesse é também do próprio deputado concessionário.

Uma rápida leitura da relação dos membros da nova CCTCI revelará que lá estão figurinhas carimbadas como, por exemplo, Eunício de Oliveira (PMDB-CE), Jader Barbalho (PMDB-PA), José Rocha (PFL-BA), Vic Pires Franco (PFL-PA) e Paulo Bornhausen (PFL-SC), com sabidas ligações com a radiodifusão.

Um leque impressionante


Não seria de interesse público que o levantamento do Correio Braziliense tivesse também incluído a CCTCI?

É ainda interessante registrar que passou praticamente despercebido da grande mídia a criação pelo plenário do Senado Federal, em 7/2, da nova Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCTICI), desmembrada da antiga Comissão de Educação, onde existia uma Subcomissão Permanente de Cinema, Teatro, Música e Comunicação Social.

Compete à nova Comissão opinar, dentre outros temas, sobre proposições pertinentes à política nacional de ciência, tecnologia, inovação, comunicação e informática; organização institucional do setor; propriedade intelectual; comunicação, imprensa, radiodifusão e televisão; outorga e renovação de concessão, permissão e autorização para serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens; regulamentação, controle e questões éticas referentes à pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico, inovação tecnológica, comunicação e informática, além de outros assuntos correlatos. Sem dúvida, um leque impressionante de temas do setor.

Vínculos com a radiodifusão


Houve protestos contra a criação da CCTICI. O senador Flávio Arns – que acabou sendo membro da comissão – chegou a afirmar que a iniciativa "fazia parte da negociação de cargos ocorrida no início desta legislatura". Entidades como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, a Associação Nacional de Biossegurança e a Associação Brasileira de Propriedade Industrial também protestaram. Temem que o desmembramento provoque "o esvaziamento e a desarticulação dos temas que estão em andamento na atual Comissão de Educação".

O novo presidente dessa comissão é o senador Wellington Salgado (PMDB-MG), suplente do atual ministro das Comunicações, Hélio Costa. E o vice-presidente é o senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), de conhecidas ligações com a Rede Record de televisão. Entre seus membros estão também senadores sabidamente vinculados à radiodifusão como Sérgio Zambiasi (PTB-RS), Maria do Carmo Alves (PFL-SE), José Agripino (PFL-RN), João Tenório (PSDB-AL), Flávio Arns (PT-SC), Eduardo Azeredo (PSDB-MG), Romero Jucá (PMDB-RR), Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) e Mão Santa (PMDB-PI).

O compromisso da mídia

É sempre interessante constatar como a grande mídia evita falar sobre si mesma ou tratar de questões a ela diretamente relacionadas. Neste caso, comportamento ainda mais curioso, de vez que o Congresso Nacional, desde a Constituição de 1988, é co-responsável com o Poder Executivo pelas concessões e renovações de concessões de radiodifusão, além de formular e decidir diretamente sobre as políticas públicas do setor de comunicações.

O primeiro compromisso da mídia e de seus jornalistas é com o interesse público. É isso mesmo, não é? Ou não é?


Por Venício A. de Lima - Observatório de Imprensa

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

Acidente da Gol: Globo minimiza erros de pilotos do Legacy

Desculpa do "Bom Dia": conjunto de erros

Paulo Henrique Amorim

Máximas e Mínimas 163

. Ontem, domingo, dia 18, discutimos aqui no Conversa Afiada a importante reportagem de Eliane Catanhêde na Folha de S. Paulo sobre a transcrição das conversas a bordo do Legacy (clique aqui para ler “Por que o transponder estava desligado”).

. O ângulo da reportagem de Catanhêde – o desastre foi provocado por um “conjunto de erros” pode ser atribuído à prudência de uma repórter respeitada como ela, que não quer se precipitar e chegar a uma conclusão antes de a investigação acabar.

. Há uma outra hipótese: o ângulo é apenas a repetição do tipo de cobertura da imprensa brasileira – inclusive o de Catanhêde, antes – que foi, sempre, responsabilizar os cretinos dos brasileiros e relevar os erros dos eficientes americanos.

. Esse mesmo ângulo – “conjunto de erros” – se repetiu na cobertura do “Bom Dia (?) Brasil” de hoje, segunda, ao tratar da reportagem de Catanhêde.

. O VT – ou seja, a reportagem propriamente dita – deu a ênfase que o texto de Catanhêde impõe: os americanos não sabiam pilotar o Legacy e o mais importante: O TRANSPONDER, QUE EVITA COLISÃO, ESTAVA DESLIGADO.

. Renato Machado e a vice-líder da Oposição ao Governo, em Brasília, Cláudia Bontempo, porém, colocaram as coisas no trilho de sempre – foi um “conjunto de erros”.

. (Lamentavelmente, não contamos com a contribuição de Miriam Leitão, que certamente nos ofereceria uma explicação sobre a importância do “conjunto de erros” no iminente fracasso do PAC).

. É mais ou menos assim: a fabricação e a condução do Titanic revelaram “um conjunto de erros”.

. Porém, um erro foi fatal: o comandante não viu o iceberg.

. O conjunto de todos os outros erros não teria provocado a tragédia.

. Mas não ver o iceberg provocou.

. Não ligar o transponder foi o erro que provocou a tragédia.

. Não foi “um conjunto de erros”.

. Um é mais importante que os outros – e decisivo.

. Não precisa esperar o relatório final: basta ler a importante reportagem de Cantanhêde.

domingo, fevereiro 18, 2007

Lula contra redução de maioridade penal

Fala, meu Presidente!

“Então eu fico me perguntando se seria justo punir apenas quem cometeu a barbaridade e se esquecer de fazer a punição a quem é o culpado por esses jovens terem chegado a essa situação. Porque são milhões de jovens que moram mal, que foram desestimulados a parar de estudar, que não têm perspectiva de emprego. Então eu fico imaginando que se a gente aceitar a diminuição da idade para puni-los, para 16 anos, amanhã estarão pedindo para 15, depois para 9, e quem sabe algum dia queiram punir até o feto, se já soubermos o que vai acontecer no mundo... Eles são, na verdade, o resultado de um momento longo de quase 25 anos em que o Estado brasileiro não cumpriu com as suas funções para com a grande parte do seu povo” O Brasil não é feito apenas de coisas ruins. O Brasil tem muitas coisas extraordinárias e precisamos mostrá-las para que sirvam de incentivo às pessoas desesperançadas”

De Os Amigos do Presidente Lula

sábado, fevereiro 17, 2007

Folha e Estado protegem governo paulista


As capas dos jornais dos três grandes conglomerados de comunicação que publicam jornais em São Paulo, reproduzidas acima, revelam a proteção em dois deles – grupos Folha e Estado – ao governo tucano de José Serra.


Como se pode ver acima, apenas o jornal Diário de S. Paulo, das Organizações Globo, publicou a paralisação das obras da linha 4 (amarela) do Metrô de São Paulo na manchete. Na Folha, o assunto ficou abaixo da dobra da primeira página, portanto sem visibilidade para quem olha o jornal dobrado nas bancas. O Estadão disfarçou um pouco a proteção a Serra e deu no alto, mas escondeu a notícia dentro do caderno Metrópoles, mesma opção feita pela Folha, que publicou a história em uma página interna e par do caderno cotidiano.

As obras da linha amarela do Metrô paulistano são as mais caras em andamento no Brasil. Um desabamento no início do ano já matou 7 pessoas e deixou uma cratera no coração do bairro de Pinheiros. Assim, custa a crer que a paralisação dos trabalhos não mereça da imprensa de São Paulo nem sequer a capa de seus cadernos locais.

No caso da Folha, em que a proteção ao tucano Serra é mais evidente, o jornal não apenas deu o menor destaque para a paralisação das obras em sua primeira página como também publicou uma pequena reportagem em que "especialistas garantem" que os problemas de soldagem encontrados em uma das estações não oferece riscos de desabamentos, contrariando o laudo divulgado anteontem pelo Jornal Nacional da TV Globo.

Alguém precisa avisar ao pessoal do Estadão e da Folha que o problema do Metrô é na verdade uma herança que Serra recebeu de seu antecessor e correligionário Geraldo Alckmin. A lambança foi feita na gestão anterior e nada tem a ver com Serra. É claro que não é bom para os tucanos reconhecer erros passados, mas no caso específico de Serra os erros na construção Metrô podem significar uma pá de cal nas pretensões de Alckmin em disputar a prefeitura de São Paulo em 2008 ou a presidência da República em 2010. Em suma, parece que os jornalões paulistas estão sendo mais realistas do que o Rei...

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Acordo com a Bolívia deixa governo muito satisfeito

Como registrou Paulo Henrique Amorim, até a Míriam Leitão elogiou. Está cada vez mais difícil para a oposição, como já deixamos registrado aqui. O texto que se segue é do sempre lúcido Franklin Martins.

A avaliação do governo brasileiro é de que o resultado das negociações com o presidente da Bolívia, Evo Morales, anunciado ontem, é extremamente positivo para o desenvolvimento e a consolidação das relações entre os dois países. Não só a questão do preço do gás foi resolvida de forma satisfatória para ambos os lados, como se abriu caminho para a realização de projetos importantíssimos que, em dez ou quinze anos, colocarão a integração entre Brasil e Bolívia num novo patamar.

A fórmula encontrada na questão do gás foi engenhosa. Politicamente permitiu aos dois países salvar a face. A Bolívia conseguiu o que queria: aumentou os preços. Atualmente, ela recebe US$ 4,20 por milhão de BTU (British Termal Unity). Pretendia elevar o preço para US$ 5, o mesmo pago pela Argentina. Na prática, o entendimento de ontem ficou a meio caminho entre as pretensões dos dois países: algo entre US$ 4,50 e US$ 4,60 . .

O Brasil também tem o que comemorar. Saiu da mesa de negociações com a garantia de fornecimento e a manutenção dos contratos anteriormente firmados. Tecnicamente, a Petrobras e a Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos assinarão um aditivo aos antigos contratos, dando forma jurídica ao “pulo do gato” que permitiu o entendimento.

Pelo acordo, a Petrobrás passará a pagar um adicional sobre os gases mais nobres, como o etano e o GLP, que vêm junto com o metano usado nas usinas termoelétricas e nas fábricas de São Paulo. Na maioria dos países, os gases mais nobres, de alto valor, usados na indústria química ou nas cozinhas, são separados na origem. Na Bolívia, isso não era feito até agora. Por outro lado, tampouco a Petrobras fazia a segregação da matéria prima no Brasil. Certamente passará a fazê-lo agora que terá de pagar pelo que antes recebia de graça.

Para muitos especialistas, a fórmula deixa claro que está para sair do papel o projeto de montagem de um pólo gasoquímico perto na fronteira do Brasil e da Bolívia, que aproveitaria o etano como matéria prima para a produção de plásticos. O assessor especial da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, um dos principais negociadores pelo lado brasileiro, confirmou, em conversas reservadas, que essa é a idéia-mãe que permitiu o entendimento na questão dos preços.

O projeto terá três grandes acionistas: a Petrobras, a YPFB e a Braskem, empresa química do grupo Odebrecht. A avaliação é que o pólo, depois de consolidado, poderia gerar de 30 a 40 mil empregos diretos e indiretos na região, com enorme impacto na economia da Bolívia e de Mato Grosso do Sul.

Outros projetos também foram postos na mesa de negociações. Dois deles são especialmente importantes em termos da cooperação econômica. O primeiro, em fase de estudos bastante adiantada, prevê a construção de uma rodovia entre La Paz e o Norte do Brasil. A estrada não só permitiria um salto na integração física e econômica entre os dois países, como aproximaria os produtos brasileiros dos portos do Oceano Pacífico. O segundo projeto, ainda em fase embrionária, é o da construção de uma grande usina hidrelétrica no Rio Madeira, na fronteira entre os dois países. A empresa teria caráter binacional, nos moldes de Itaipu, onde Brasil e Paraguai são sócios.

Já do ponto de vista político, a avaliação do governo brasileiro é de que os entendimentos dos últimos dias foram importantíssimos, porque assentaram as bases para uma cooperação de longo prazo. Para o Brasil, isso é duplamente importante. Primeiro, porque o estreitamento das relações com a Bolívia gera inúmeras possibilidades econômicas e comerciais para o nosso país. Segundo, porque favorece o crescimento econômico e a estabilidade política da Bolívia, país com quem compartilhamos nossa fronteira mais extensa. São 3.500 quilômetros que tanto podem nos unir como nos separar, tanto podem trazer progresso como imensas dores de cabeça. Ter um sócio, um parceiro e um amigo ao longo de uma fronteira tão extensa é muito melhor do que ter de conviver com um vizinho problemático, ressentido e instável na casa ao lado.

Blindagem

Por José Dirceu

Nota do Painel da Folha de hoje (só para assinantes), intitulada "Blindagem", registra que o Metrô de São Paulo contratou o escritório de Miguel Reale Júnior para defender seus diretores em ações criminais motivadas pelo acidente nas obras da linha 4. A empresa do governo alegou "inexigibilidade de licitação" para escolher o advogado, que foi ministro de FHC e tesoureiro da campanha presidencial de Geraldo Alckmin.

Estou curioso para saber como a nossa imprensa vai tratar essa informação. Imaginem o escândalo que fariam se coisa semelhante ocorresse no governo Lula? Contratar sem licitação um escritório de um ex-ministro e tesoureiro da campanha presidencial para defender uma empresa do governo. O mundo, certamente, cairia sobre as nossas cabeças.

Com a palavra, o Ministério Público Estadual.

O federalismo caboclo

Por Luis Nassif

Outro dia estava ouvindo a analista política Lúcia Hipólito fazer uma acendrada defesa do federalismo americano. Se não me engano a propósito da defesa de legislações estaduais para crimes.

Também quero, é tudo o quanto sonhei. E seria de implementação simples. Bastará uma pequena Medida Provisória com poucos artigos:

Artigo 1 - A partir de hoje fica implantado o sistema federativo norte-americano no Brasil.

Artigo 2 - Ficam revogados a partir desta data dois séculos de federalismo brasileiro, hábitos e costumes arraigados sedimentados ao longo desse período.

Artigo 3 -- Será obrigatório o exercício da iniciativa e a busca da auto-suficiência em todas as unidades federativas.

Artigo 4 -- Ficam, desde já, proibidas menções a pensadores brasileiros que criticam, desde o início do século esse hábito brasileiro de achar que se podem implantar leis e instituições sem levar em conta as limitações do ambiente interno.

quinta-feira, fevereiro 15, 2007

Reduzir ou não, eis a questão

O Brasil já teve conspiradores melhores

Por Luiz Antonio Magalhães - Nova-E

Mídia vive nova fase no combate a Lula

A cada dia que passa, fica mais nítido o fenômeno: depois de perder a guerra da conquista de corações e mentes no ano que importava – 2006, quando estava em jogo a reeleição do presidente Lula –, a grande imprensa brasileira vive uma espécie de ressaca da derrota do projeto que defendeu no ano passado. Remar contra a maré não é uma tarefa simples e os veículos estão tentando descobrir o tom para fazer oposição a um presidente que talvez seja o mais popular da história do país.

Há os que insistem em picuinhas – para a revista Veja, da editora Abril, por exemplo, qualquer picuinha serve, como o leitor pode verificar na condenação do suposto anti-americanismo da política externa do atual governo, presente nas páginas amarelas desta semana.

Tem também o pessoal mais "nasty", especialmente na Folha de S. Paulo, um jornal cheio de má-vontade com tudo ocorre no planeta e que, no tocante ao Brasil, tenta mostrar que o Executivo federal só faz besteiras e está sempre munido de malvadas segundas intenções. Um raciocínio típico da Folha é o seguinte: se o governo deixou de fazer algo, antes mesmo de saber a razão o jornal conclui que foi porque alguém avisou que a falcatrua fora descoberta.

Há por fim os mais "ideológicos", de crítica radical, mas razoavelmente civilizada, como a turma do Estadão e, em parte, de O Globo.

É certo que no dia a dia as reportagens e textos dos grandes jornais, revistas e portais de internet contêm uma mistura desses três estilos. Nos blogs conservadores, como o de Reinaldo Azevedo, a pancadaria no governo é mais forte e muitas vezes inconsequente em função da prolixia desse meio. Os podcasts de Diogo Mainardi, por exemplo, já começam a se parecer peças cômicas, tamanho o distanciamento entre o que se ouve ali e a tal "talk of the town" que ele gostaria de ser porta voz. No máximo, Mainardi consegue exprimir a conversa da última reunião de pauta da Veja e os telefonemas ao seu amigo Azevedo. O Brasil já teve conspiradores melhores.

O fato é que está faltando um "gancho", como se diz no jargão das redações, para bater forte no governo. Sem mensalão, dossiê Vedoin ou escândalo dos sanguessugas, o trabalho ficou realmente mais complicado. A oposição também não anda ajudando, o PSDB está praticamente de joelhos e o PFL desidratou, caindo de 65 deputados eleitos para pouco mais do que 50. Aparentemente, resta aos opositores de Lula esperar que os "aloprados" reapareçam ou que o presidente comece a ter arroubos chavistas, tome um porre e mande expulsar o Larry Rother do país. Se nada disto acontecer, vamos todos passar 4 anos acompanhando futricas de salão contra o presidente e o PT e lendo recados cifrados de Serra para Aécio e vice versa.

Como a vida não pode ser tão chata, talvez Ciro Gomes se mostre disposto a animar um pouco as coisas. E aí, podem apostar, Mainardi e sua turma passarão a se dedicar à nobilíssima tarefa de tentar evitar que Ciro chegue lá em 2010. Pelo menos Lula ficará longe dessa chateação...

Reflexões para os que não se divertem com o carnaval

Pacto com a morte

Neste momento em que parlamentares e jornalistas incentivam uma reação irracional contra os assassinos do pequeno João Hélio, levantando até idéias como a pena de morte, vale discutir como são construídos os criminosos no Brasil.


Mauro Santayana

Quando uma jovem da alta classe média paulista – Suzana Richthofen - planejou e participou do assassinato de seus pais, trucidados, enquanto dormiam, a golpes de barras de ferro pelo namorado e o irmão dele, ninguém pediu a pena de morte para a moça. Ao contrário: surgiram comunidades de internautas, dizendo que a amavam. Da mesma forma, quando um índio pataxó foi queimado, enquanto dormia, para o divertimento de rapazes da alta classe média brasiliense, respeitável juíza do Distrito Federal quis desclassificar o crime, a fim de evitar que fossem levados ao tribunal do júri. Algumas das pessoas de bem da capital da República se mobilizaram, a fim de desculpar os assassinos. Eles estavam apenas querendo “brincar” com o índio. Depois se soube que os rapazes estavam sendo privilegiados na prisão: um deles saía para freqüentar o curso universitário e, entre o fim das aulas e o retorno a uma cela especial da penitenciária, tomava cerveja com os amigos.

É claro que nos revolta muito mais a morte de uma criança de seis anos, da forma brutal como ela se deu, do que a execução de duas pessoas de meia-idade, e a de um remanescente dos bravos tapuias do litoral da Bahia, membro de pequena tribo que escapou do extermínio secular.

A morte por nada
O que choca, ainda mais, no caso do menino João Hélio, é a extrema precariedade da vida nas grandes cidades brasileiras. Morre-se sem nenhuma explicação, como se todos nós andássemos com uma pistola carregada, jogando a roleta-russa. Quando menos se espera, a única bala fica diante do percussor, e o dedo invisível das circunstâncias dispara o gatilho. Se a mãe do menino houvesse passado pelo local cinco minutos antes, ou cinco minutos depois, talvez nada houvesse ocorrido. Ao sair do centro espírita naquele exato momento e ao escolher aquele trajeto, a senhora estava, para seu desespero, entregando o filho ao despropositado martírio.

Todos nós nos sentimos atingidos pelo crime, mas não temos a mesma carga de sofrimento e de ódio que atinge os pais do garoto. Eles têm todo o direito de exigir punição mais severa para os criminosos – até mesmo a morte – incluída a do menor que participou do assassinato. Se pensarmos no que sentiríamos se isso ocorresse a qualquer um de nós, não há limite para o ódio, não há como conter o desejo de vingança pessoal. Qualquer pai seria capaz de matar o assassino de seu filho, ou de sua filha, como tem ocorrido. A senhora, que matou a facadas o adolescente que violentara seu filho pequeno, fez o que muitos de nós seríamos capazes de fazer.

Quando crimes tão bárbaros são cometidos há uma reação coletiva irracional. É o que está ocorrendo agora, quando se pede a pena de morte para os assassinos do pequeno João Hélio. E essa reação é tão mais despropositada quando parte de alguns dos mais poderosos meios de comunicação de massa em nosso país. É o momento da desforra de parte da classe média contra os que defendem os direitos humanos. Jornalistas e parlamentares recorrem aos adjetivos mais fortes, arregalam os olhos, gesticulam, pedindo que o Estado exerça vingança implacável contra os assassinos. Eles se esquecem de que todos nós, criminosos ou não, já estamos condenados à morte. E se esquecem também de que a execução de qualquer criminoso, seja jovem ou velho, não é exatamente um castigo. A agonia de um condenado dura, quando muito, alguns segundos. Depois disso, é o nada. A prisão por bom tempo, nas condições carcerárias do Brasil de hoje, talvez seja punição bem pior do que a morte.

A construção de um bandido
Como se faz um criminoso? Os criminosos, salvo os casos de psicopatia congênita, são construídos, não nascem feitos. A nova deputada federal Marina Magessi, veterana policial carioca, não pode ser apontada como esquerdista, fanática defensora dos “direitos dos bandidos”. Ao contrário: sempre foi vista como “durona” na ação policial. Em recente depoimento à TV Câmara, em companhia do rapper MV Bill, Marina Magessi lembrou que o dia mais difícil da sua vida foi o do assalto ao ônibus da linha 174, em 2000, no Rio, porque teve que prender uma menina de 12 anos, envolvida no incidente. Ela resume o problema, ao dizer que nesses episódios não há algozes: só há vítimas. A menina era tão vítima como Sandro do Nascimento o assaltante, um sobrevivente do massacre da Candelária, que seria assassinado logo em seguida pela polícia, e a jovem Geisa Gonçalves, morta durante a intervenção policial.

“Não é a pobreza que leva ao crime, mas, sim, a falta de inclusão” – disse a mesma senhora, em outra oportunidade. “No Rio, essas crianças não pertencem a nada. Não têm família, não têm igreja, não têm Estado”. Se quisermos ir mais fundo no problema, devemos deixar os limites das favelas, do Rio de Janeiro e do Brasil. Escolhemos nessa pobre cultura universal contemporânea, induzidos pelos meios de comunicação de massa, sobretudo do cinema e da televisão, modelo de vida que pode ser definido como o de pacto com a morte. Passamos parte de nossa vida vendo as balas penetrarem na testa de bandidos ou não, acostumamo-nos com o jorro de sangue e, em certos casos, experimentamos voluptuosa emoção diante dos corpos que tombam. Mesmo os homens mais velhos se recordam da influência do cinema nos jogos infantis - e a violência daquele tempo era quase inocente, diante da que nos chega, pela televisão, todos os dias. Brincava-se, então, de artista e bandido. Os heróis eram artistas, e os vilões, os bandidos. Era o mito da “violência positiva”, que os norte-americanos haviam criado, com suas “short-stories”, destinadas a distrair os trabalhadores imigrantes do início do século XX, que depois passaram a ser filmadas por judeus húngaros, em Hollywood. Ainda que houvesse, em contraponto, a arte de Chaplin e outros, o mito da violência acabou prevalecendo. Chaplin era um realizador para quem conseguia pensar.

Hoje, crianças de três, quatro anos, treinam para matar nos vídeo-games, em que, do sangue que espirra dos atingidos pelas balas virtuais, só falta o cheiro da morte. Os super-heróis ganharam a força dos elétrons.

O Brasil não é pior
Há quem debite a violência brasileira ao nosso caráter. É uma conclusão estúpida. O Brasil tem cerca de duzentos milhões de habitantes, e uma exígua parcela dessa população se envolve em episódios violentos, seja no campo ou nas cidades, maiores e menores. Os criminosos não chegam a meio por cento da população. Crimes horripilantes – como os de canibalismo - ocorrem no berço da civilização ocidental, que é a Europa, isso sem falar nos Estados Unidos, onde meninos de dez, onze anos, matam seus colegas de escola a tiro limpo. As penas são pesadíssimas e, em alguns Estados, como o Alabama, o Arizona, e Lousiana, crianças de qualquer idade poderiam ser condenadas à morte até 1º de março de 2005, quando a Suprema Corte proibiu a execução de menores de 18 anos, com base na oitava emenda da Constituição, que proíbe castigos cruéis. Nem por isso a criminalidade juvenil nos Estados Unidos se viu reduzida.

A juíza e a policial
A presidente do Supremo Tribunal Federal, Ellen Gracie, fez a observação certa: os legisladores não podem agir sob a pressão das circunstâncias. É necessário ver todos os ângulos do problema. No caso, com toda a diferença biográfica entre a jurista e a inspetora de Polícia que se elegeu deputada, as duas se encontram do mesmo lado da razão. Para uma é preciso que a lei esteja dentro da lógica do direito; para a outra, que conhece a realidade de perto, é muito difícil distinguir entre algozes e vítimas. E, já que citamos o rapper MV Bill, não podemos desprezar o seu duro libelo, pelo menos no que toca ao tráfico de drogas. É o viciado da classe média (ele também uma vítima de um modo de vida opressivo) que faz o traficante. E podemos levar o tema mais longe: são os viciados norte-americanos e europeus – e os que “lavam” o dinheiro sujo do tráfico - que promovem o cultivo da coca na América do Sul e o da papoula no Afeganistão, crescente mesmo com a invasão militar estrangeira. É bom não esquecer que os ingleses moveram duas guerras contra a China (a segunda delas aliados aos franceses) porque o governo chinês proibira o uso do ópio, e a puritaníssima Inglaterra, da Era Vitoriana, era exportadora do narcótico, cultivado na Índia, para o grande mercado do Império do Meio. O mundo anglo-saxão tem todas as razões para temer uma revanche amarela.

Enfim, estas são algumas reflexões para os que não se divertem com o carnaval.

terça-feira, fevereiro 13, 2007

Bonner e Fátima emitem opinião em bate papo ao vivo

Jamais imaginaria publicar uma linha que fosse do aclamado (não por nós do Votolula) ex-blog do prefeito do Rio César Maia. Mas - por incrível que pareça - ele faz uma observação importante e curiosa sobre o que assistimos dia 12 de fevereiro no Jornal Nacional. William Bonner e Fátima Bernardes batendo papo sobre o tema do mês da rede Globo, o assassinato do garoto João. César Maia acerta. Se ele usassse seus poderes para o bem...

OPINIÃO NO JN

Ontem no JN, o casal locutor -Bonner e Fátima- introduziu uma conversa em família sobre o caso do menino João. O máximo de informalidade na pergunta a Fátima sobre a entrevista com os pais da criança. Respostas e comentários entre si, opinando -Bonner e Fátima- sobre o caso. Uma inovação. Para quem assistia, a opinião não era da emissora, mas opiniões pessoais, como se estivessem em família, do casal.
Em artigos recentes no jornal o Globo, o diretor executivo de jornalismo da TV Globo -Ali Kamel- defendia a tese que no jornalismo se deve ter o máximo de objetividade na cobertura dos fatos. E opiniões, só em editoriais. Mas ontem o JN inovou. Foi além da opinião editorial, além da opinião do tipo-âncora,( Casoy por exemplo), e avançou para um tipo de opinião informal, casual, em família. É possível que isso dê mais força a opinião e sensibilize mais a audiência. No entanto, vale a pena avaliar do ponto de vista do jornalismo esta inovação. Especialmente o que acha o jornalista Ali Kamel dela. "

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

Veja faz defesa explícita do PSDB


Vejamos trechos de matéria desta semana, da revista Veja. Passo a vocês o começo e o final da ‘reportagem’:

“Em seus dezenove anos de história, o PSDB percorreu uma trajetória de sucesso: criou uma personalidade própria, atraiu algumas das melhores cabeças da vida brasileira e conquistou dois mandatos presidenciais. Sob seu comando o Brasil recebeu os empuxos modernizantes que, por inércia, impulsionam o país até hoje: a abertura econômica, as privatizações, o controle da inflação e a Lei de Responsabilidade Fiscal. É, portanto, um partido com uma história respeitável e de sucesso, com princípios claros, os quais dezenas de milhões de brasileiros aprovaram no passado e estariam prontos a aprovar de novo se lhes fosse dada a chance de entender seu real alcance. Mas não conte com os tucanos para essa tarefa. O que houve?”

- Melhores cabeças da vida brasileira?

- Princípios claros?

- Os brasileiros estariam prontos a aprovar de novo?

Ave, Pai! Vejamos o final:

“O PSDB está com vergonha de ter aberto a economia e feito privatizações, não acha que seja avanço ter aprovado a Lei de Responsabilidade Fiscal e não se orgulha da autoria do golpe de morte que debelou o mais cruel imposto sobre os pobres, a inflação. Mais um pouco de vacilo e logo teremos petistas contando como Lula e o PT fizeram o Plano Real contra feroz resistência de FHC e do PSDB. Sempre perde quem subestima a capacidade dos vencedores de reescrever a história.”

Apenas algumas observações:

- Quem “abriu a economia” foi Collor, o PSDB não teve nada com isso.

- O Plano Real foi implantado no Governo de Itamar. Se FHC fosse economista, poderia pelo menos reclamar parte da autoria. Mas não é. Ele assinou os documentos e assumiu o risco. Ponto para ele, mas seu papel como “autor do Plano” se limita a essa coisinha mais cênica.

No mais, é um panfletão e tanto, hein? Panfleto clássico, aliás, pois não se limita a enaltecer um partido e esconder TODOS os seus defeitos: ele também faz especulações maliciosas a respeito do ‘inimigo’.

E ainda tira um sarro quando fala em “reescrever a história”. Afinal, quem atribui ao PSDB a “abertura da economia” não está fazendo outra coisa.

A explicação para a derrota do PSDB, portanto, é a falta de divulgação de suas virtudes. Viram que simples? O partido é perfeito! O partido não erra! Não há outro motivo além desse!

Por que escrevem umas coisas assim, hein? Será que alguém realmente acredita nisso? -Imprensa Marrom.

Do ótimo http://osamigosdopresidentelula.blogspot.com/

PS - faço o reparo a tempo: o texto originalmente foi produzido por http://www.imprensamarrom.com.br/, muito bom também.

A segunda morte de João

Passei a semana passada muito incomodado pelo destaque exagerado, pela insistência da Rede Globo em explorar todos os mais sórdidos ângulos da tragédia acontecida com aquele pobre menino de 6 anos no Rio de Janeiro. Era evidente que o desejo da emissora - se ela pudesse - seria mostrar o que sobrou do corpo em frangalhos do garoto, tal foi o cuidado para recuperar em minúcias todo o incidente, e repetir a mesma informação trocentas vezes. Esse incômodo me remoeu o final de semana inteiro, e fez parte de um diálogo com minha esposa aqui em casa. Temos um filho de 11 anos, e nem se desligássemos a TV poderíamos poupá-lo dos "detalhes sórdidos". Fica a impressão de que o Rio piorou, fica a impressão que vivemos uma escalada de violência. Qual nada! Vivemos apenas a decadência do noticiário e a sanha absurda da mídia pra atrair a nossa atenção, a todo custo. Ainda bem que hoje amanhecemos com mais um texto iluminado do Luis Nassif. Ele, mais uma vez, fala o que eu queria ter dito, se eu fosse bom como ele.

Por Luis Nassif

O problema dos grandes crimes que chamam a atenção da opinião pública é a exploração rasteira que se sucede a eles. Cria-se um movimento catártico que vende jornal , mas não aponta saídas; expõe as vísceras, mas não as causas; mostra o problema e não discute a solução.

Nessa cegueira ampla que o show exige, acaba toda a catarse confluindo para soluções simplistas e/ou falsas, como a questão da maioridade penal, um pequeno detalhe dentro de uma engrenagem muito mais ampla e letal.

A família é envolvida por esse show indecente, na vã esperança de que o sacrifício do filho não será em vão. Será sim. O único resultado palpável será aumentar a venda de jornais e a audiência das televisões. E permitir ao veículo se aproximar, se mostrar solidário a todos os telespectadores e leitores, vítimas potenciais do crime, ajudando a estimular sentimentos baixos de vingança, não a reflexão.

Tem-se um quadro amplo de criminalidade, com várias etapas entre a iniciação e a profissionalização do criminoso. Começa pelo ambiente em que a pessoa vive e na falta de oportunidades de uma vida dentro da economia formal.

O ambiente é o entorno, com a facilidade com que crianças são abordadas por traficantes e criminosos em geral. Passa por esse blefe inventado por especialistas como André Urani de que houve melhora na renda familiar depois que as mães tiveram que sair de casa para complementar a renda insuficiente do pai, sem computar os efeitos dessa ausência sobre a estrutura familiar. Some-se a falta de valores, típico de uma sociedade fragmentada, sem projeto de nação, sem projeto de solidariedade, onde até spams abjetos – como o tal “Elite Privilegiada”, falsamente atribuída a mim – têm ampla aceitação junto a setores basbaques da opinião pública.

O entorno se completa com as condições das escolas. E aí é falta de gestão em todo seu espectro. É um quadro dantesco, mais ainda no Rio de Janeiro, nas favelas dominadas pelas milícias e pelo tráfico. Some-se a internacionalização do tráfico e do crime e se terá o mapa do inferno.

O entorno é isso. Já o futuro é cinza, e aí o motivo é falta de crescimento na veia.

Por outro lado, a falta de gestão e a politização da máquina pública levaram a uma corrupção desenfreada que pega parte das forças policiais em todo país. Pelas informações, de forma muito mais ampla no Rio de Janeiro. O crime se profissionaliza e tem um exército de mão de obra reserva quase infinito.

Aí essas campanhas abjetas simplificam tudo. O cidadão, encurralado por todo esse quadro complexo e, aparentemente, insolúvel, finalmente “identifica” o inimigo, aqueles ladrões de carro, que passam a ter cara, identidade e cor. Trocam toda a reflexão necessária sobre como enfrentar esse quadro dantesco, pelos sentimentos que vêm das partes baixas, das entranhas embrutecidas pelo show diário de violência que se vê nas ruas e nas TVs.

E, aí, é apenas aguardar a próxima tragédia para o menino João poder descansar em paz, enquanto o show continua.

No meio desse insensatez, a faixa solitária esticada no Maracanã é um respingo de bom senso: "De olho por olho, a cidade ficará cega".