quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Do Brasil que tem água para o Brasil que não tem água: pela transposição das águas do São Francisco

Com a volta do tema à mídia, e o destaque dado à carta do padre que fez greve de fome, estamos aqui para retomar o debate e esclarecer as (boas) razões para que o Brasil que tem água permita ao Brasil que não tem água desfrutar de uma ínfima parte da vazão do São Francisco. Pra começo de discussão vamos publicando aos poucos os bons argumentos que embasam a vontade do presidente Lula, do governo - mas também a de vastas parcelas da opinião pública e principalmente, dos esquecidos do semi-árido nordestino.

I – O Rio

1 - É verdade que o Rio São Francisco está morrendo?


Não. O Rio São Francisco ainda é um rio muito saudável e pujante. Ele tem sido muito ameaçado pelos impactos da ação do homem, de que são exemplos a poluição por esgotos, as barragens construídas ao longo do seu leito para a geração de energia elétrica, o assoreamento causado pelo desmatamento crescente dos cerrados em benefício da agropecuária, e a agressão às suas matas ciliares. Apesar disto, o rio segue resistindo bravamente. Ele é e será uma fonte de sustentação econômica para os habitantes de sua bacia hidrográfica, porque continua a receber, na média, a mesma quantidade de chuva de antes, mantendo, sem alteração, há mais de duas décadas, o suprimento de energia elétrica ao Nordeste, beneficiando por igual todos os Estados da região. A quantidade de suas águas não está comprometida e o São Francisco está em melhor situação qualitativa do que muitos rios do Sudeste. Portanto, o rio não está morrendo.

2 - Mas o Velho Chico tem problemas?

Sim, o Velho Chico precisa ser mais bem cuidado, principalmente nos afluentes mais degradados pela ação humana, como tantos outros rios do país. Em alguns trechos, a derrubada das matas, que cobriam suas margens e encostas, provocou o assoreamento do leito do rio, que é a formação anormal de bancos de areia, o que prejudica a navegação e o habitat dos peixes. Em outros lugares, a falta de tratamento de esgoto das cidades ribeirinhas provocou a poluição das águas. De fato, é preciso cuidar melhor do Rio São Francisco.

3 - O rio precisa ser revitalizado?

Sim, e isso já está acontecendo. A revitalização hidroambiental da bacia do São Francisco é um programa coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, com a participação do Ministério da Integração Nacional e da sociedade sanfranciscana. O programa de revitalização do São Francisco contempla ações voltadas para o reflorestamento de áreas críticas, a construção de barragens em rios afluentes, a melhoria da calha navegável do seu curso médio, o tratamento de esgotos das cidades e vilas localizadas nas suas margens, o controle da irrigação e a educação ambiental. Há também ações para a melhoria das condições de vida das comunidades ribeirinhas. O Governo Federal investiu, em 2004, R$ 26 milhões nessas ações de revitalização do rio. Em 2005, os investimentos para a revitalização do rio chegaram a R$ 100 milhões, só na área dos Ministérios da Integração Nacional e do Meio Ambiente. Há outros recursos: desde 1988, a Chesf repassa, diretamente para os Estados e os municípios da Bacia do São Francisco, 6% do seu faturamento bruto, o equivalente a R$ 90 milhões por ano. É um dinheiro que, segundo a Lei, deve ser obrigatoriamente aplicado em ações de revitalização do rio. De 1988 até agora, a Chesf já repassou R$ 1,350 bilhão para os municípios sanfranciscanos. O Ministério das Cidades, por sua vez, está aplicando R$ 620 milhões em projetos de saneamento básico e/ou de abastecimento d’água em 86 municípios da Bacia. A degradação do rio, que já dura mais de 100 anos, não é uma ação de curto prazo e nem é responsabilidade somente do Governo Federal, mas também dos governos estaduais e municipais, que devem trabalhar juntos para o enfrentamento do problema.

4 - É verdade que o Rio São Francisco vai ser desviado?

Absolutamente não. Não é nada disso. O Velho Chico vai continuar no mesmo curso que sempre teve. Só uma pequena parte do seu volume – ou seja, apenas 1% da água que ele joga no mar – vai ser captada para garantir o consumo humano e animal na região do semi-árido nordestino, onde vivem 12 milhões de pessoas. Não haverá nenhum problema ambiental para o São Francisco ou para qualquer atividade econômica que hoje se desenvolve ao longo de seus 2.700 km de extensão. A quantidade de água a ser retirada é, realmente, muito pequena.

5 - Ainda assim, a retirada de água para perenizar outros rios não é prejudicial ao Rio São Francisco?


Não, por várias razões. Em primeiro lugar, há disponibilidade de água no Rio São Francisco para utilização no desenvolvimento do Polígono das Secas, assim como se tem feito com a sua energia hidrelétrica. Em segundo lugar, e é importante que se repita isto, a quantidade de água a ser retirada é muito pequena. A terceira razão é que essa captação vai ocorrer apenas em dois pontos e em locais onde a vazão do rio já está regularizada pelas barragens, não afetando as atividades econômicas nem a navegação. A quarta razão, é que a água a ser retirada vai ser usada principalmente para o consumo humano, para matar a sede de milhões de nordestinos que habitam o Polígono das Secas. Tudo isso será feito sem prejudicar o Rio São Francisco e em clima de concórdia, pois cabe ao Governo Federal zelar pela distribuição das oportunidades de desenvolvimento entre os irmãos brasileiros.

6 - Os usuários do São Francisco terão prejuízos?


Não, porque o curso do rio não será alterado e muito menos serão afetadas as condições hídricas e ambientais. Com esse projeto, vai acontecer o mesmo que já acontece em centenas de outros pontos do rio: haverá captação de água para abastecimento humano. O que muda é a quantidade de água, um pouco maior do que é captado em cidades de médio porte. Mas, ainda assim, a quantidade de água a ser retirada equivale a somente um por cento do que o rio joga no mar. Além disso, há milhões de pessoas vivendo no semi-árido com muito pouca água. Quando chega a seca, muitos não têm água nem para beber. Seria desumano ignorar essa situação dramática que aflige o Nordeste há séculos.


Continua...
Se quiser palpitar, fique à vontade. Amanhã falaremos sobre a geografia humana da questão.

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